SERVIÇOS DE
SAÚDE
Temos assistido, nos últimos dias, a um espetáculo degradante, nalguns
hospitais do Serviço Nacional de Saúde, no que toca às condições de
acolhimento, de instalação e de tratamento de muitos dos doentes que recorrem
àqueles serviços. Degradante pelas condições oferecidas e pelo desrespeito
pelos direitos básicos dos utentes, que ali permanecem por longas horas, se não
mesmo dias, com parco alimento, sem condições de higiene e expostos às
vulnerabilidades uns dos outros. São os próprios profissionais de saúde –
médicos e enfermeiros – a denunciá-lo, requerendo outras condições de serviço e
de atenção aos doentes. Uma situação que se agrava neste período do ano, devido
particularmente ao surto de gripe e às doenças a ela associadas.
Se
esta pode entender-se como uma contingência própria de um período especial do
ano, temos de atender que temos uma população cada vez mais necessitada de
apoio hospitalar, fruto do aumento do número de idosos, com o envelhecimento contínuo
da sociedade portuguesa, o que levará a um recurso cada vez maior a estes
serviços hospitalares.
Neste contexto, vivemos, contudo, um processo contraditório: aumentam as
necessidades, porque aumenta a população idosa; mas concentram-se meios
hospitalares, fechando-se os pequenos hospitais de apoio que respondiam a
muitas destas situações de assistência hospitalar.
Quando, há mais de dezoito anos, cheguei a estas terras bairradinas,
para o serviço que me é próprio, tínhamos, para além dos Hospitais da
Universidade de Coimbra e de Covões, os hospitais de Anadia, Cantanhede e
Águeda, que, num raio geográfico não muito distante, respondiam às necessidades
básicas da população. Entretanto, a tendência foi para a concentração de
serviços, por razões económicas, o que despersonalizou o atendimento,
concentrou o número de doentes, alargando naturalmente os tempos de espera para
atendimento, e degradou a qualidade dos serviços de saúde, não obstante o
empenhamento das equipas de saúde – médicos, enfermeiros e auxiliares de ação
médica.
Por
outro lado, ao longo deste período pude acompanhar a emergência de uma ideia e
sua materialização na construção do Hospital da Misericórdia da Mealhada. Uma
resposta qualificada, em colaboração com os parceiros dos serviços de saúde,
capaz de responder com muita qualidade às necessidades da população da Mealhada
e zonas limítrofes. Um projeto que nasce de uma visão alargada do provedor e
direção da Santa Casa da Misericórdia da Mealhada e que hoje se constitui como
uma das maiores mais-valias em termos de qualidade de vida e de saúde dos
munícipes da Mealhada. Uma ideia feliz, de serviço ao público, que hoje
qualifica a Mealhada no cômputo dos seus serviços mais relevantes. Mais tarde,
Anadia seguiria caminho semelhante, com a entrega à Misericórdia local do Hospital
Luciano de Castro, mantendo este algumas das especialidades médicas que
respondem, em proximidade, às necessidades dos habitantes daquele município.
Penso que estes dois exemplos – de construção e de reconversão – bem
podem servir de visão de futuro, no que toca à saúde em Portugal. Mais do que
concentrar em si a gestão de todos os serviços de prestação de cuidados de
saúde, o estado deve tutelar a saúde, no seu todo, mas em cooperação com
parceiros capazes, como estes que acabo de identificar. Se agíssemos assim
certamente não assistiríamos, tão frequentemente, aos dramas da massificação de
doentes em hospitais públicos; e muitas pessoas, sobretudo no interior do nosso
país, teriam cuidados de saúde a que hoje dificilmente podem aceder. A saúde necessita
de uma forte reflexão e de um renovada visão para corresponder às necessidades
fundamentais dos portugueses, de forma capaz, digna e personalizada.
Pampilhosa, 18 de Janeiro de 2018
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(71ª Reflexão)