sábado, 4 de agosto de 2018


CUIDAR OS PENSAMENTOS

   Os cristãos estão a viver um tempo litúrgico de preparação para a maior festa cristã: a Páscoa! É um tempo de renovação pessoal, de renovação das relações interpessoais e do acolhimento do infinito amor de Deus.

   Um dos aspetos que sempre esteve presente no aprofundamento da vida espiritual foi o cuidado com os pensamentos. Tanto mais que no rito da confissão, que recitamos sempre em cada Eucaristia, referimos isso mesmo: «pequei muitas vezes por pensamentos, palavras, atos e omissões». Ora, referir que pecamos por pensamentos pode significar, para alguns, meramente um ato ritual; para outros, uma conceção tradicional; para alguns, ainda, uma espécie de ato autopunitivo ou limitativo da liberdade; e para outros, por fim, deixou de ter qualquer significado.

   Todavia, cuidar dos pensamentos é uma necessidade premente – não para nos punirmos ou flagelarmos, mas sim para cultivarmos uma vivência feliz! Aliás, por mais paradoxal que possa parecer, é isso que todos nós hoje afirmamos: a necessidade de cultivar pensamentos positivos. Exatamente pela consciência de que os nossos pensamentos trazem à tona da vida as nossas emoções e projetam as nossas ações. Assim, se algum de nós, por razões de natureza pessoal, de vivência familiar, de deficiências nas relações interpessoais, por razões afetivas ou sociais, ou até mesmo por temperamento, com dificuldade de inter-relação, cultiva pensamentos negativos em relação aos outros, não raro vive num permanente inferno interior, de desolação, de sofrimento, de angústia, de tristeza e, não raro, de sofrimento, por vezes, mesmo, de consequências físicas. Quando alguém alimenta sentimentos de raiva, de ódio, de má querença para com os demais, vive essencialmente uma vida infernizada, sem aquele sabor da alegria e da paz, que a vida deve compreender.

   De igual modo, quando, por razões semelhantes, sobretudo de formação pessoal ou de vivência afetiva, alguém cultiva sentimentos negativos em relação a si mesmo, encontra como consequência a falta de autoestima, o abatimento, a tristeza, ou uma certa sensação de infelicidade.

   Urge cuidarmos dos nossos pensamentos! Não para nos punirmos, qual silício que nos leve à moderação de desejos, mas sim para vivermos a vida feliz para que todos nós fomos criados. Não se trata de nos alhearmos do que somos no mais profundo de nós, das nossas emoções e mesmo das nossas relações interpessoais. Tão pouco se trata de pactuarmos com vivências humanamente indignas ou injustas. Trata-se, isso sim, de saber aceitar o que somos, sem nos escondermos de nós mesmos, de trabalharmos pela dignificação das várias vivências humanas, de nos empenharmos em ser justos para connosco e para com os outros, mas sem cultivarmos sentimentos de rancor, de ódio, de perda de estima pessoal, de conflito ou de rutura com os demais. Por vezes, estes sentimentos negativos habitam apenas o nosso interior e são fonte de um enorme peso, porque retiram à vida a beleza e a serenidade de que esta se deve revestir.

   Independentemente das circunstâncias externas, mais favoráveis ou menos favoráveis, com que todos temos de lidar, a orientação dos nossos pensamentos depende de nós mesmos. E da sua orientação depende o nosso bem-estar ou a nossa infelicidade.

   Afinal, afastar alguns pensamentos menos bons, como propõe a espiritualidade cristã, não é algo de ultrapassado. Nós é que tornámos redutora essa proposta, porquanto a orientámos essencialmente para as questões da afetividade e da sexualidade. Afastar os maus pensamentos leva-nos a uma revisão de nós mesmos, pois os pensamentos são determinantes na orientação das nossas vidas: são eles que nos permitem assumir positivamente as nossas emoções e nos ajudam a definir ações mais assertivas em ordem à tranquilidade e ao bem-estar pessoal e inter-relacional.

   Cuidar dos pensamentos é um convite para todos. No seu cuidado seremos certamente mais felizes, pessoal e comunitariamente.

Pampilhosa, 22 de Fevereiro de 2018
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(76ª Reflexão)