sábado, 4 de agosto de 2018


PARA QUE NÃO SE ESQUEÇA!...

   Completa-se, no próximo domingo, um ano sobre os terríveis incêndios que assolaram os concelhos de Pedrogão Grande, Castanheira de Pêra e Figueiró dos Vinhos. Um drama terrível, com as consequências humanas e patrimoniais que todos pudemos constatar.

   Um ano volvido, importa fazer memória! Exatamente para não esquecermos! Com o intuito de reviver o flagelo daqueles dias? Certamente que não! Ressuscitando a angústia e a dor que perpassaram as vidas de tantos irmãos nossos naquelas horas aflitas? Certamente que também não! Embora conscientes de que existem ainda muitas dores não saradas, vidas resignadas à sua sorte, na memória viva da perda de familiares ou amigos, ou na constatação prática de um património perdido, dificilmente recuperável ou que efetivamente pereceu para sempre. Sabemos que existem pessoas, nestes concelhos, que se reerguem com dificuldade, bem à imagem daquele pinhal que se recupera no fluir do tempo e que é um pálido símbolo destas vidas em recomposição.

   Jamais podemos esquecer as vidas humanas perdidas naquele incêndio! Adultos, jovens, crianças, idosos… Quantos sonhos, projetos e perspetivas de vida se desfizeram em cinza, com aquelas vidas perdidas?!... Fazer memória destes irmãos que partiram é um dever nosso!

   Mas fazer memória, também, dos múltiplos bens patrimoniais perdidos – privados e públicos. Se é certo que nada se compara à perda de uma habitação ou dos bens de sustento, que muitos viram inesperadamente desfeitos no flagelo das chamas, sem equiparação em termos de perdas; também é verdade que todos nós fomos desapossados de um imenso património verde, que assegura o equilíbrio da nossa vivência comum e distingue o país que somos, na sua beleza paisagística. Realidade ainda mais agravada nos incêndios de Outubro. Porventura um flagelo que o tempo poderá refletir nas nossas vidas, à medida que o futuro se fizer presente.

   Mas, volvido um ano, é tempo de fazer memória para um renovado empenho na reconstrução do que o fogo fez perecer. Se as vidas humanas não se podem recuperar para a nossa história comum, lembramo-las, em atitude humana ou de fé, nessa outra dimensão da existência, no coração ou na eternidade que, em qualquer dos casos, é sempre motivo de esperança. Distinta, mas motivo de esperança!

   Urge, para que a memória seja ativa, recuperar o que necessita de recuperação, para assegurar uma vida digna a quem ficou sem recursos, e rever as nossas formas de agir, no sentido de assegurar um futuro mais seguro, sereno e tranquilo diante destes fenómenos que, com maior ou menor gravidade, tendem a assolar o nosso território. Neste sentido, a melhor forma de fazer memória será, por certo, persistir na mobilização solidária e fraterna, partilhando ainda com quem necessita da nossa generosidade e atenção. E tenhamos presente que ainda existem algumas carências a necessitar da nossa ajuda. Corremos o risco, na volatilidade do tempo e na hodierna volatilidade da informação, de rapidamente passarmos a outras preocupações, sem nos determos mais naquilo que a todos mobilizou num passado recente. O presente carece ainda de alguma disponibilidade para correspondermos, todos juntos, às necessidades destes nossos irmãos.

   Mas fazemos igualmente memória para assumir, de vez, as medidas públicas e privadas que assegurem uma nova gestão da floresta, na sua requalificação e reorganização. Estas medidas são acatadas às autoridades públicas, mas são responsabilidade igual das entidades particulares, mormente dos proprietários florestais. Temo que, neste aspeto, não tenhamos aprendido a lição. Não basta que as entidades públicas decretem medidas de limpeza e de resguardo das habitações. É necessária outra disponibilidade e determinação, da parte dos particulares, para se assumir, em conjunto, uma nova gestão da floresta, assumindo as disposições legais já definidas, seja no que toca à continuidade ou descontinuidade de espécies florestais, seja no que se refere à necessidade de aceiros, seja nas demais medidas que urge implementar. E, neste aspeto, pelo que me é dado ver, estamos a falhar!

   Fazer memória para que não se esqueçam os que partiram e os que carecem da nossa presença solidária. Mas fazer igualmente memória para reconstruirmos um território mais seguro, mais ecológico e mais aprazível.

Pampilhosa, 14 de Junho de 2018
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(92ª Reflexão)