sábado, 30 de junho de 2007

Ide e anunciai!


Evangelização hoje!

Na sequência de uma reunião de catequistas, reflectia alguns aspectos que é necessário assumir para levar a cabo uma séria Evangelização nos dias de hoje.
Em primeiro lugar, não podemos pretender Evangelizar contra a cultura de hoje, com saudades de um clima passado mais propício a esta tarefa. Isto é, somos enviados a Evangelizar o homem de hoje em todas as suas circunstâncias: sociais, culturais, afectivas, etc. Nisto podemos ter presente o exemplo de São Paulo, que soube falar aos homens de seu tempo, partindo da sua cultura e das suas vivências.
Em segundo lugar, exige-se hoje um Catecumenado sério, um verdadeiro caminho de Iniciação Cristã, adaptado a estes novos tempos, que permita alcançar os objectivos da Evangelização: formar verdadeiros discípulos de Cristo. Para tal, este caminho há-de ser de iluminação intelectual, afectiva, celebrativa e de verdadeiro compromisso, tendo em conta as diversas vertentes de uma verdadeira Iniciação Cristã: ao conhecimento doutrinal , à celebração, à oração, à vivência moral e ao empenho missionário.
Para que seja possível este processo, cada vez mais havemos de cuidar dos agentes de Evangelização. Aqui assume particular importância o ministério do Catequista nas nossas comunidades. Ele tem de ser pessoa carismática, capaz de exercer a missão a que é chamado pela comunidade e, portanto, coerente com todo o projecto cristão. Antes de mais, ele é chamado a ser testemunha da verdade que anuncia.
O modo como se efectua, ou não, esta Evangelização é estruturante de toda a vida das nossas comunidades. Não teremos vivências de compromisso cristão e comunitário sem este compromisso primeiro de uma iniciação completa, que contemple todas as vertentes apontadas.
E afinal, importa recordá-lo sempre, esta é a tarefa primeira confiada à Igreja: "Ide e anunciai a Boa Nova!"

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Outra imagem da Turquia...


Encontramos aqui vários compartimentos
escavados na rocha.
É neste conjunto que encontramos
as capelas de onde retirei o Pantocrator.

Turquia.


Um espaço muito bonito, com vista para rio, em Istambul.

O Pantocrator.

A imagem do Pantocrator foi fotografada por mim numa das Capelas subterrâneas da Turquia.



Pensamento do dia!

"O maior presente
que podemos oferecer a alguém
é aquele que não se vende
nem se compra: o amor.
Deus colocou muito amor
no nosso coração.
A nossa resposta de gratidão
consiste em partilhá-lo.
Somos simplesmente
intermediários nessa missão.
Sem o calor humano,
a vida pode tornar-se um deserto."
(Tarcila Tommasi, Mensagens de Sabedoria, Ed. Paulinas, p. 9)

A Sedução do Divino!

"Seduziste-me, Senhor, e eu me deixei seduzir! Dominaste-me e obtiveste o triunfo."(Jer. 20, 7)
Esta expressão, proclamada por Jeremias sete séculos antes de Jesus - que ele proclama em perspectiva pessoal -, bem pode ser a expressão da nossa condição humana quando se dispõe a procurar o Divino. O homem de cada tempo e, por isso, o homem deste tempo, necessita de procurar Este Divino. Procura-O na compreensão do Seu ser; procura-O em obediência à sua razão, esclarecendo conceitos, ideias, questões; procura-O em atitude de fé, escutando-O e respondendo-Lhe. Mas, acima de tudo, o homem procura o Divino no limite de si próprio, na sua autoconsciência, na percepção da sua efemeridade, muito embora pressentindo o seu destino absoluto. É aí, no mais íntimo de cada um, que Deus se revela, se autocomunica em experiência sedutora. Importante há-de ser sempre a humana atitude de inteira disponibilidade para acolher e dialogar com tudo o que ao coração se coloca como interpelação e chamamento. É aí - quantas vezes -, no mais recôndito do existir como mistério, que Deus surge em acto de sedução. Não uma sedução por limite, mas uma sedução por amor. Não numa luta por triunfo, mas numa luta por dádiva de Si. É também aí que o homem se experimenta como fruto desse amor e como recepção generosa.
Não raro vou encontrando atitudes limitativas, porventura desonestas, na capacidade que o homem tem de se olhar a si mesmo, sem receios, em toda a sua nudez. Conceitos filosóficos, ideias absolutizadas, esquemas pré-definidos, tudo pode servir de justificação para o existir. No entanto, esse existir, enquanto mistério, só ali encontra sentido: na verdade que brota e preenche o anseio humano. E esta verdade será apenas uma: a que possibilita, e o coração aceita, como a total realização de si.
A luta do homem pela afirmação da sua autonomia, do Renascimento à pós-modernidade, levou-o, quantas vezes, ao completo isolamento, ao efémero de uma consciência marcada pelo limite, à frustração completa de si e à renúncia da sua exigência mais íntima de plenitude e realização. Dos racionalismos, de Descartes e de outros, aos existencialismos que se formulam como esboços de resposta ao exisitir, tudo parece ser ultrapassado pela medida do tempo e da história. A actualidade, centrada na afirmação de algumas destas ideias, é um tempo de profundas carências, onde a falta de sentido parece impôr-se. É também, por isso, um tempo de profunda procura! E aqui, sim, sejamos honestos, não limitemos o coração humano pelos nossos preconceitos; demos-lhe o gozo da liberdade na busca sincera da possível realização e da plenitude.
É nesta atitude que contemplo grandes homens da nossa cultura: Guerra Junqueiro, Antero de Quental e, mais recentemente, Miguel Torga ou mesmo Virgílio Ferreira.
Todos eles marcados por uma intensa procura, feita de total sinceridade, de liberdade, mas, sobretudo, buscando a verdade sem medos nem preconceitos. Se uns chegaram à contemplação do Divino, de forma explícita, acredito que outros o desejaram, contemplando-O no limite do seu existir. A angústia de Virgílio Ferreira, na contemplação do ser humano, encontra a solidariedade de Torga, que, não obstante, chega a afirmar:
"Vivo
A sonhar ser conviva
Doutro banuete"
(Fome Indecisa, 1949)
Mas se porventura destes se não pode afirmar um encontro pessoal e jubiloso com o Divino, pelo menos de forma explícita, o mesmo não acontece com Quental ou Junqueiro. Este último, o grande bastião do sarcasmo na luta anticlerical, não deixa de ser o seu mais severo crítico, de tal modo que pretende refazer essa obra A Velhice do Padre Eterno. Sabendo que seria tarde e questionado sobre o porquê, é o próprio que responde: "Devia isto à minha consciência! Pratiquei erros e entendo que confessá-los não é vergonha mas virtude." Mais ainda, após a denúncia profunda do seu actuar, ele expressa a sua nova realidade: "Oh! Mas agora modificaram-se totalmente as minhas opiniões sobre a Igreja, em que há figuras angélicas como o Santo de Assis, e nobres e geniais como a de Gregório, o Grande, que a salvou na sua mais perigosa crise. E toda a minha pena é de não poder eliminar esse livro da minha obra ou, pelo menos, de alterá-lo fundamentalmente, pondo-o de acordo com o meu actual modo de sentir e de julgar..."
Guerra Junqueiro, fiel aos príncipios cristãos, que assume e tão bem canta na sua poesia, vive uma profunda sede de justiça e de fidelidade a si próprio. Canta quando diz:
"Farei da cega luz que me alumia
A luz espiritual do grande dia,
A luz de Deus, a luz do Amor, a luz do Bem,
A luz de glória eterna, a luz da luz, amém!
(Oração à luz)
As afirmações que acabo de fazer não surgem com intuíto apologético; ao contrário, respeitando a autocrítica de Junqueiro, julgo que também alguma «oposição» à Igreja pode ser salutar, no sentido de esta se rever no fundamental, em contínua atitude crítica.
No entanto, parece-me profundamente redutor e de uma extrema injustiça para com Junqueiro, quando alguém o cita apenas nesse período anticlerical, desconhecendo o todo da sua obra, ou escondendo-o prepositadamente, para fazer valer alguns princípios ideológicos, políticos ou culturais.
A sedução do Divino, a Fé, não pode ser algo de impessoal ou de imposto; mas também não pode ser, em nome da verdade, algo recusado de forma gratuita ou banida sem essa procura serena, profunda e sincera.
É aí, longe de qualquer olhar mediador, que Deus estabelece a sedução do homem.
Antero de Quental percebe-o. E, no dealbar da existência, canta-a dessa forma magnífica:
"Na mão de Deus, na sua mão direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.
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Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mão de Deus eternamente!
(Na Mão de Deus)
(Texto escrito em 1998 - Carlos Alberto Godinho)

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Em busca de Deus!...

Talvez seja fácil, para nós crentes, falar de Deus. Falamos tanto d'Ele. Quantas vezes de forma ritualizada, sem deixar que o Seu nome tenha em nós o impacto que merece e de que necessitamos.
Para um poeta, como Antero de Quental, que se afirma não crente, ler a sua poesia é permitirmo-nos entrar num coração à procura do verdadeiro rosto de Deus. É esta sinceridade e profundidade que me atrai neste grande homem das letras. Vejamos:

Ignoto Deo
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Que beleza mortal se te assemelha,
Ó sonhada visão desta alma ardente,
Que reflectes em mim teu brilho ingente,
Lá como sobre o mar o sol se espelha?
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O mundo é grande - e esta ânsia me aconselha
A buscar-te na terra: e eu, pobre crente,
Pelo mundo procuro um Deus clemente,
Mas a ara só lhe encontro... nua e velha...
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Não é mortal o que eu em ti adoro.
Que és tu aqui? olhar de piedade,
Gota de mel em taça de venenos...
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Pura essência de lágrimas que choro
E sonho dos meus sonhos! se és verdade,
Descobre-te, visão, no céu ao menos!
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E na obra de onde recolho estes sonetos, o autor termina com uma outra forma de profissão de fé:
Na Mão de Deus
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Na mão de Deus, na sua mão direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.
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Como as flores mortais, com que se enfeita
A ignorância infantil, despojo vão,
Depus do Ideal e da Paixão
A forma transitória e imperfeita.
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Como criança, em lôbrega jornada,
Que a mãe leva no colo agasalhada
E atravessa, sorrindo vagamente,
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Selvas, mares, areias do deserto...
Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mão de Deus eternamente!
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Antero de Quental
Não pode deixar de nos comover este desafio, esta ânsia de Deus, esta procura de sentido... No fim, apenas a Sua mão nos pode acolher.
Carlos A. Godinho

Perda e Encontro do Sagrado!

O tempo presente é marcado por uma perda e, simultaneamente, por uma nostalgia do sagrado. As Igrejas ditas tradicionais parecem não convencer, não motivar os mais novos a participar na sua vida e nas suas celebrações, sendo estes cada vez mais seduzidos por formas de espiritualidade mais individual e atraídos por novas práticas, caracterizadas, algumas delas, por um forte exotismo. Aliás, esta espiritualidade vende-se hoje como tantas outras coisas, numa complexa procura de felicidade e bem-estar. Basta olhar os escaparates de algumas livrarias, com suas secções de “Espiritualidade e Esoterismo”.
Se em causa está um fenómeno religioso e cultural complexo, que exigiria uma análise exaustiva destas novas expressões da religiosidade actual, não deixa de estar, também, uma provocação implícita às Igrejas, que identificamos como tradicionais, nomeadamente à Igreja Católica.
Desde logo, não obstante a sua missão primeira de ser enviada a Evangelizar, continuamos a deparar-nos com uma formação religiosa deficiente, assente numa prática muito ritualizada e sem grande exigência em termos de verdadeira Iniciação Cristã. Espelho disto mesmo são as nossas catequeses. Estamos convictos (e digo-o no plural, porque não sou apenas eu a afirmá-lo!) que a formação cristã que ministramos não chega a tocar, em muitas circunstâncias, o âmago das vivências pessoais, capaz de fazer, de quem por ela passa, verdadeiros discípulos de Cristo, objectivo definido como essencial. E pactuamos com este status quo, ao mantermos os mesmos esquemas, as mesmas exigências e as mesmas práticas. De algum modo, iludimo-nos, numa prática entre vivências de Cristandade e novos tempos.
Urge, inequivocamente, encontrar novos caminhos, novas práticas, novas exigências – talvez a adequação de um Catecumenado sério, adaptado aos nossos tempos.
Uma das ambiguidades deste tempo é precisamente a contradição entre o excesso de movimento, de barulho, de agitação, próprios do mundo hodierno, e a ânsia de silêncio, de recolhimento, de meditação, tão bem expresso nas diversas formas de yoga e de novas vivências espirituais, marcadas pelo recolhimento, importadas da tradição Oriental.
Ora é aqui que a Igreja tem de investir também. Sem silêncio, sem meditação, sem recolhimento, prendemo-nos excessivamente ao ritual, ao exterior, que a certo momento deixa de assumir novidade, tornando-se cansativo, repetição de gestos e de palavras que carecem da sua dinâmica interior. A Igreja tem hoje de investir cada vez mais aí: em recuperar espaços de interioridade, que dêem sentido à experiência religiosa, que é, simultaneamente, encontro com os outros e encontro com o Outro. Sem esta experiência de fundo, a vivência espiritual não tem raízes e, como tal, dificilmente pode produzir frutos.
Tanto mais que se vulgariza a procura da igreja em momentos de silêncio e de solidão, como espaço apaziguador; se encontram necessidades de escuta do silêncio (quantas vezes através da música!), como possibilidade de encontro consigo próprio.
O Papa, em comunhão com os Bispos, vem, em certo sentido, colocar a tónica na necessidade de interioridade, ao chamar a atenção para as nossas celebrações, na Exortação pós-sinodal Sacramento da Caridade. E nós devemos usar critérios claros de leitura destas propostas, não nos deixando enredar numa poeira informativa que, de imediato, se levanta em torno destas orientações.
Há um longo caminho a percorrer. Mas encontramos sinais positivos. Recordo dois: há uns anos, quando pároco de Bolho, ouvia da boca de uma catequista a chamada de atenção das suas crianças para a necessidade de falar com Jesus, junto ao Sacrário, como tinham feito uma vez; e hoje, pároco de Luso, dou graças a Deus por um conjunto de Jovens (a celebrar os vinte e cinco anos da sua Associação de Jovens Cristãos!) pelos tempos de silêncio e recolhimento que sabem viver, acompanhados pela simbologia da tenda, quando a par de momentos de descontracção e de lazer, se encontram uns com os outros e com o Outro, chamado Jesus, em momentos de silêncio fecundo.
Afinal, não nos é pedido nada de particularmente novo, mas de potenciarmos uma experiência fundante da Igreja, numa capacidade de diálogo com este tempo, assumindo esta sensibilidade a um conjunto de valores, mas também as diferenças que nos distinguem, sem receio e com determinação.


Carlos Alberto da Graça Godinho