EUROPA
Celebrámos nesta semana o dia da Europa, como sempre acontece a 09 de
Maio de cada ano. Este dia definiu-se a partir da data do célebre discurso
fundador da União Europeia, que teve
como sua primeira concretização a CECA – Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço. Este discurso, proferido por Robert Schumann,
Ministro dos Negócios Estrangeiros da França, a 09 de Maio de 1950, ficaria
mesmo conhecido como a Declaração
Schumann. Inserido no contexto do pós 2ª Grande Guerra Mundial, em que era
necessário harmonizar as relações entre a França e a Alemanha, criou o sonho de
uma Europa unida e solidária. Efetivamente, podemos definir como principais
ideais europeus, já no discurso de Schumann, a paz, a solidariedade, a unidade
entre todos os povos europeus, apontando, inclusive, para uma «federação»
europeia.[1]
Estas perspetivas delineadas por Schumann foram acolhidas com enorme
entusiasmo, criando-se uma dinâmica que conduziria à atual União Europeia. Aos ideais iniciais, juntavam-se ainda outros, como
o de uma europa de culturas, na valorização e respeito por cada cultura
nacional, formando, no seu conjunto, um imenso património cultural europeu. Um
projeto que tive oportunidade de aprofundar, nos bancos da faculdade, quando
estudava História, e que sempre me apaixonou, particularmente quando, a par
desta unidade, o mundo se globalizava.
Contudo, volvidos 67 anos sobre este discurso, a União Europeia vê-se a braços com a sua sobrevivência e com a
fidelidade aos ideais que presidiram à sua construção. Com efeito, a Europa
deixou de ser uma união solidária, segundo aquela perspetiva de Schumann, como
ele afirmava no seu discurso: «A Europa não se fará de um golpe, nem numa
construção de conjunto: far-se-á por meio de realizações concretas que criem em
primeiro lugar uma solidariedade de facto»[2]. Isto é, uma construção
contínua com base na solidariedade entre os povos europeus.
Ora,
se assim foi, nos seus primeiros tempos, a União
Europeia organiza-se hoje como uma instituição burocrática, acima dos
estados europeus e seus cidadãos, cavando o seu próprio fosso. Sinal evidente
disso mesmo são os múltiplos nacionalismos, que o projeto inicial procurou combater,
e que pululam atualmente por todo o espaço europeu. É curioso que, na semana em
que celebramos o dia da Europa, nos tenhamos sobressaltado com as eleições
francesas, onde a extrema-direita, fascista e nacionalista, se afirmou como
segunda força nacional para a presidência daquele país.
Num
estudo profundo – uma tese de doutoramento sobre as contradições da União Europeia – o brasileiro Luiz
Felipe Osório, define um conjunto de vicissitudes que determinam a atual crise
da Europa, que aqui apenas posso elencar: o seu modelo neoliberal, baseado numa
moeda sem estado; uma estrutura dominada politicamente por essa economia
liberal; a falta de uma fiscalidade unificada; o descolamento da política
económica relativamente à política social; uma clivagem imperialista entre o
centro e a periferia; e uma forte deterioração democrática.[3] Para acrescentar, a jeito
de conclusão: «os tecnocratas comunitários formulam soluções mecânicas e
abstratas para lidar com problemas concretos»[4].
Aceitando tal quadro, que nos parece evidente, consciencializamo-nos que
a União Europeia, assente nestes
métodos e princípios ideológicos não tem possibilidade de futuro.
Mas
creio – como certamente muitos creem – que a Europa poderá rever-se na sua orientação,
refundando-se na sua dinâmica de construção.
Pessoalmente, julgo ser esta a hora do regresso aos seus ideais de
fundação; de regresso ao discurso de Schumann e de tudo o que ele encerra para
o progresso integral da Europa; de regresso a uma autêntica solidariedade entre
os povos, que mobilize cada europeu em torno de um projeto que sinta efetivamente
como seu. Na hora presente, urge afirmar que é necessário determinação para
renovar a Europa! A União Europeia ainda
tem futuro; assim o queiram os seus principais responsáveis.
Pampilhosa, 11 de Maio de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(46ª Reflexão)
[1]
Cf. SCHUMANN, Robert – A Declaração de
Schumann de 9 de Maio de 1950. Disponível em https://europa.eu
[2]
Ibidem
[3]
Cf. Luiz Felipe Brandão Osório – Um
Estudo Crítico da União Europeia: contradições do seu desenvolvimento
institucional e normativo. Rio de Janeiro, UFRJ, Março de 2015, pp. 140 –
153.
[4]
Ibidem, p. 150.