sexta-feira, 17 de junho de 2016

Género


GÉNERO


    Um dos sinais mais inquietantes da cultura hodierna, pelo que significa de degradação da identidade humana e da sua intersubjetividade e comunhão, é a atual questão do género. Uma séria antropologia, assente em factos e não em simples teorias, perfilha o princípio fundamental de que nos dividimos entre o masculino e o feminino; isto é, entre a riqueza de ser homem e de ser mulher. Este é um dado fundamentalíssimo da nossa identidade humana, que assenta numa conceção antropológica com bases científicas – seja na conceção física, psíquica, afetiva ou espiritual de cada ser humano. Todos nós somos homem ou mulher; e nunca uma realidade neutra; ou, menos ainda, uma realidade metamórfica que nos permita ser uma e outra coisa, de forma alternada ou permanente, como se em nós subsistisse o «Hermafrodito» - a divindade grega híbrida que, em certo sentido, representava a união entre Hermes e Afrodite.

   A teoria de género fez o seu percurso ao longo dos últimos séculos, particularmente com as lutas feministas, na procura de suplantar a dominação masculina sobre o feminino, ganhando nova cidadania a partir da década de setenta, do século passado, com os estudos de género (gender studies). Mas estes estudos deram origem, atualmente, a uma ideologia – a ideologia de género - que dificulta a compreensão do ser humano, provocando uma autêntica revolução no conceito de pessoa. A ideologia de género absolutiza o individuo e o seu desejo subjetivo, independentemente de fatores determinantes de caráter físico, psíquico, afetivo ou social. Esta ideologia, assente em quatro pilares fundamentais: a negação da diferenciação entre homem e mulher, que subsiste apenas devido a uma distinção social, e que será necessário ultrapassar; a separação entre sexualidade e reprodução; a separação entre sexo e género, o que significa que cada um pode ter uma característica sexual e optar por viver um género diferente; e a multiplicação de termos para enquadrar novas possibilidades de autodeterminação de género, rejeitando como pensamento retrógrado e anticientífico quem reafirme os princípios tradicionais; coloca-nos face a uma visão subjetivista e desestruturadora da realidade humana, conduzindo-nos a uma conceção de pessoa que nega o que há em nós de mais profundo, pois nunca se pode estabelecer a cisão entre ser físico e ser psíquico ou espiritual. O ser humano é uno, sendo estas dimensões, que se interpenetram, constitutivas da identidade própria de cada individuo. Certamente enquanto dado natural e socialmente adquirido, sempre em aprofundamento, mas em conformidade com essa mesma identidade.

   Partilhando o princípio da ideologia de género, chegaremos à negação da nossa identidade pessoal; bem como à confusão do que pretendemos ser. Por outro lado, a ideologia de género, abre espaço a uma desestruturação social, onde a autêntica inter-relação, que é alteridade, em última instância se transforma em absoluto egocentrismo, solidão existencial e isolamento.

   Criados em «igualdade, enquanto pessoas humanas» (cf. CIC. 369), homem e mulher são feitos um para o outro (cf. CIC. 372), completando-se nessa entrega.

   Atente-se, todavia, que a negação da ideologia de género não significa a inaceitação terminante, sem discernimento, de outras formas de vivência da sexualidade e da intersubjetividade, que não podemos agora analisar. Terminologias como heterossexualidade, homossexualidade, bissexualidade ou transsexualidade, derivam da mesma conceção básica da natureza humana, ou seja do modelo primeiro do ser homem e mulher; deixando espaço, depois, ao modo como pessoalmente isso é vivenciado.

   Aceitar a ideologia de género significaria negarmos a nossa identidade pessoal e social. Necessitamos urgentemente de nos redescobrir como pessoas, na nossa identidade mais profunda; e como pessoas em relação, o que modela toda a nossa vida em sociedade!

 

Pampilhosa, 09 de Junho de 2016

Pe. Carlos Alberto Godinho
(4ª Reflexão)