sexta-feira, 17 de junho de 2016

Amor


AMOR
 

   Ouso hoje refletir convosco sobre uma temática universal, das mais caras a cada um de nós, enquanto pessoa – o Amor! Algo de tão forte e tão banalizado! Forte, porque o amor é essencial à vida humana: nascemos por amor, existimos por amor e vivemos para amar! Sem amor a vida perderia não apenas o seu sentido, mas também o seu fundamento. Bastaria perceber como a inteligência afetiva influencia todo o nosso agir; e como sem afeto a vida se torna inviável (um dos documentários que mais impressionou, neste sentido, há anos, foi precisamente o de uma creche, na China, onde as funcionárias podiam alimentar os bebés, mas sem lhes tocarem, sabendo que eles morreriam por falta de afeto, expresso no toque).

   Mas o amor – essa plataforma da existência – tende hoje a banalizar-se ou a contradizer-se! Talvez daí encontrarmos à nossa volta tanta solidão. Já não me refiro a programas televisivos, como o «Love on Top», onde o amor se comercializa, para se tornar em produto de sucesso.

   O amor é entendido, não raro, como a satisfação de si, em vez da procura do bem do outro, numa negação da sua identidade própria, fechando o sujeito na vivência de um egocentrismo que nega a natureza própria do amor.

   Mas face à pergunta: o que é o amor?, talvez muitos se ergam afirmando que este é indefinível! Talvez! Talvez apenas possamos conceder aos poetas a aproximação ao seu conceito! Talvez! Contudo, ouso arriscar um sentido e uma lógica para o amor. E faço-o segundo um conceito cristão! Um dia, em diálogo com os seus discípulos, no momento dramático em que prepara a entrega plena da Sua vida, Jesus diz-lhes: «É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei» (Jo. 15, 12). Ora, segundo esta expressão, a medida do amor está na dádiva do Mestre, medida esta que só se entende no mistério da Sua cruz. Face a esta grandeza de amor, a lógica, para nós, é percetível: o amor é dádiva! Não dádiva de qualquer coisa, mas dádiva de si mesmo! Se necessário, até ao fim! De tal modo, que o bem do outro se transforma no meu próprio bem! É esta, para mim, inequivocamente a lógica clara do amor!

   Esta lógica, da entrega, é visível, depois, em múltiplas experiências humanas: na capacidade que os pais têm de abdicar de tudo por causa de seus filhos, procurando apenas o bem destes; no cuidado que uma filha presta ao seu pai ou à sua mãe idosa e acamada, por vezes já inconsciente, mas a merecer toda a atenção, carinho, e mesmo sacrifícios pessoais; naquela atitude – que tanto me impressionou, há tempos, na televisão – de um idoso que cuidava da sua esposa vítima de Alzheimer, que já não o reconhecia, mas que, mesmo assim, ele tinha dificuldade em aceitar vê-la partir, cuidando dela com todo o esmero; em cada voluntário ou voluntária, que dispondo de alguns anos da sua vida para servir quem está em maior necessidade, longe ou perto, sem nada em troca, nada mais visa senão a melhoria de condições de vida, de saúde ou de educação, daqueles a quem serve; de religiosos e religiosas que partem para os sítios mais recônditos, onde tudo falta, para levar carinho e novas possibilidades de vida humanamente mais digna, a quem a não tem!... São múltiplos os exemplos humanos de amor, cuja raiz é sempre a mesma: a dádiva de si! Essa dádiva que contribui para um autêntico bem do outro! Daí que o amor seja sempre centrifugo, partindo do coração e da ação de cada um ao encontro dos outros; e não centrípeto, buscando nos outros a satisfação pessoal ou das suas necessidades!

   O Amor é dádiva! Necessitamos, pois, de renovar o amor, deixando que ele dê sempre, de modo renovado, um sentido novo às nossas vidas pessoais e às nossas vidas em comunidade!

 

Pampilhosa, 16.06.2016

Pe. Carlos Alberto Godinho
(5ª Reflexão)