terça-feira, 25 de outubro de 2016

A Vitalidade da Esperança!


A VITALIDADE DA ESPERANÇA


   Após o terrível incêndio que, em Agosto passado, lavrou por estas terras Bairradinas, e mesmo ainda antes da época das chuvas, deslocando-me, há dias, pela estrada nacional, em direção à Mealhada, constatava como, por entre as árvores queimadas e um chão de cinza, surgem já alguns tímidos sinais de verdura, prometendo uma nova vida àqueles espaços negros e tristes, onde o fogo tudo transformou em morte aparente. São os fetos que começam a brotar; os rebentos de eucalipto que despontam – não obstante a preocupação dos silvicultores, porque nocivos à reflorestação desejada; o despertar de matos e outras plantas endémicas, que começam a querer surgir!... Como que deixando adivinhar uma natureza vigorosa, capaz de se reinventar e de redimir um passado próximo de grande destruição.

   Ao passar por ali e ao reparar nestes indícios de nova vida, vinha-me à mente a perceção de que estes ténues sinais de recomposição são como que uma bela metáfora a iluminar algumas situações da nossa vida humana: confrontados, quantas vezes, com dramas pessoais ou familiares, de naturezas tão diversas, criamos a noção, por momentos, de que a vida desaba, desfazendo-se em negras cinzas, onde apenas resta a tristeza e a total desolação. Face ao fracasso, à angústia, à dor, ou, especialmente, à possibilidade da morte, a vida como que se desfaz num campo de cinzas, onde todo o vigor e pujança é substituído pela tristeza de uma paisagem escura e sem vida. Essa paisagem interior, espelhada num rosto fechado, de preocupação, de lágrimas, ou de angústia!...

   Se são mais que legítimos tais sentimentos, face às múltiplas formas de dor e à evidência dos limites humanos; também não é menos certo que, não raro, em tais circunstâncias, nos deixamos agrilhoar pelo momento presente, sem almejar um qualquer outro futuro. Identificando esse presente, inclusive, com a noção do tempo que pára; expressão tão comum para traduzir a nossa angústia, face aos acontecimentos que, aparentemente, imobilizam as nossas vidas. 

   Contudo, tal como na natureza, também a nossa vida se renova permanentemente. Por vezes, com sinais ténues de um novo despontar, num processo lento de renovação da alegria e da esperança, da confiança e da serenidade. Mas tudo se renova! E à distância, sem que as cicatrizes da dor se desfaçam, a vida ganha um novo sentido. Não é por acaso que a sabedoria popular afirma, de forma proverbial: «não há mal que sempre dure, nem bem que se não acabe», remetendo-nos para a permanente novidade – para o bem e para o mal, é certo! – que define a nossa existência humana.

    Com esta consciência, necessitamos, nas horas difíceis e de dor, de alargar o nosso olhar interior, na esperança de que um tempo futuro cure as feridas do momento presente. Como a nova vida, que brota da terra, a recompor o solo das cinzas, necessitamos, nessas horas de dor, de um futuro que ilumine o presente, na certeza de que nada permanece insanável e de que tudo permanentemente se refaz! Necessitamos, pois, de reconquistar horizontes de vida! Isto, exatamente: horizontes de vida! Marcados por rejuvenescimentos de esperança! Mesmo quando a vida nos trai e no horizonte se inscreve a morte!

   Para quem é crente, mesmo aqui, na morte - pese embora, como para os demais, se experimente a mesma dor da perda e da ausência de quem é querido - abre-se um horizonte infinito de esperança, um rejuvenescimento absoluto da vida, uma transfiguração da paisagem humana, em que do pó e da cinza, se ergue uma nova natureza, um ser radicalmente novo, transfigurado numa eterna primavera – o mistério da ressurreição! Não já uma renovação da vida, sem mais, mas a vida em plenitude, como se de uma eterna primavera se tratasse!

   A vida humana, jogada entre alegrias e dores, tem sempre no seu horizonte uma contínua esperança! Uma esperança que é sentido e alento! Uma esperança que urge reconquistar permanentemente! É que – como bem refere José Luís Nunes Martins - «cada esperança abre horizontes infinitos e possibilidades imprevistas»!

 

Pampilhosa, 20 de Outubro de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(20ª Reflexão)