quarta-feira, 3 de maio de 2017

Páscoa!


PÁSCOA

   A palavra Páscoa, com origem no hebraico pesah e no aramaico phasha, por via do grego pascha, significa literalmente «passagem», ou «trânsito»[1].

   Para o povo hebraico, a páscoa significava a libertação do Egito, pela mão de Moisés e a condução à Terra da Promessa que o Senhor, o Deus de Israel, lhes havia prometido. Na verdade, a páscoa judaica celebra o início desse trânsito e a passagem a caminho da terra prometida. Para os cristãos, a Páscoa toca o mistério mais profundo de toda a nossa existência humana – a passagem da morte à vida! Efetivamente, celebrando o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, o Filho de Deus que desceu à nossa humanidade, e que por nós deu a Sua vida, celebramos igualmente com Ele a nossa passagem a essa mesma vida, como dom que nos vem da graça batismal. Com esta certeza, afirmava São Paulo: «Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram. Porque, assim como por um homem veio a morte, também a ressurreição dos mortos veio por um homem» (1Cor. 15, 20 – 21). Na verdade, Cristo foi o primeiro a ressuscitar – como primícia – para nos fazer viver uma vida semelhante à Sua. E essa graça já nos foi dada pelo dom batismal, pois, como afirma a Igreja, pelo batismo «somos regenerados como filhos de Deus» e «tornamo-nos membros de Cristo» (CIC. 1213). Ora, ser regenerado significa, etimologicamente, nascer de novo (regenerare), precisamente porque nos tornámos membros de Cristo. N’Ele, o Senhor Vivo e Ressuscitado, vivemos uma vida nova. Este é o grande dom pascal e a fonte de toda a nossa esperança. Por isso esta é a nossa maior alegria, que não nos cansamos de proclamar neste tempo.

   Mas se a Páscoa tem este sentido para quem é crente – judeu ou cristão -, que significado poderá ter para quem não tem fé? Numa perspetiva transcendente, os cristãos creem que Cristo morreu por todos e a todos concedeu já uma vida nova. Por isso se empenham no anúncio permanente desta boa notícia (evangelion) a cada um dos seus irmãos, para que todos n’Ele acolham esta boa nova. Contudo, numa perspetiva meramente imanente ou horizontal, a ressurreição é um convite à permanente renovação da vida humana. Perante as múltiplas situações de morte que a humanidade, e cada um de nós, enfrenta, em tantas circunstâncias, somos convidados, neste tempo, a passar dessas vivências de morte à renovação do dom da vida. São sinais de morte a violência, a guerra, a injustiça, a mentira, a maledicência, a desonestidade, o roubo, a deslealdade ou a infidelidade. Como são sinais de morte tantos vícios que, depauperando a dignidade da vida humana, condicionam a vida como uma existência livre. O tempo da Páscoa, enquanto «passagem» ou «trânsito» é um convite singular à renovação. Passar da morte à vida, significará então assumir a não-violência, a construção da paz, a luta pela justiça e pela verdade, o cultivo da bondade e da honestidade, a lealdade ou a verdadeira fidelidade.

   Mas, acima de tudo, a Páscoa é a grande realização do amor – da entrega da vida de Alguém que, por amor de nós, aceitou oferecer-se até ao fim. Dessa entrega em que emerge a absoluta novidade da Ressurreição. Se a consideramos em sentido pleno, tendo como consequência essa vida que jamais terá fim; não deixamos de a considerar também como um convite permanente, para todos, a fazer da nossa história pessoal e coletiva, uma contínua passagem do nosso egoísmo ao autêntico e verdadeiro amor. Realidade que não é exclusiva de alguns, mas sim património de todos! O amor, que está no centro de toda a vida humana, como seu fundamento e sentido, será por certo o grito maior a ecoar na Páscoa de cada um de nós – crentes e não crentes!

   A todos, votos de uma Páscoa Feliz!



Pampilhosa, 13 de Abril de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(42ª Reflexão)



[1] FLORISTÁN, Cassiano – Voc. Páscoa. In FLORISTÁN, Cassiano – Dicionário de Pastoral. Porto: Editorial Perpétuo Socorro, 1990, p. 402.