quinta-feira, 6 de abril de 2017

Trabalho!


TRABALHO 

   O trabalho é um direito fundamental da pessoa. Assim o afirma explicitamente a Carta Internacional dos Direitos Humanos, quando refere: «Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego» (art. 23º, § 1). Seguida, depois, pela lei fundamental de vários países, como Portugal, que afirma, na sua Constituição da República Portuguesa: «Todos têm direito ao trabalho» (art. 58 § 1º). Princípio essencial que, segundo a mesma Constituição, se poderá assegurar conquanto o Estado assuma o compromisso de promover «a execução de políticas de pleno emprego; a igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais; a formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores» (art. 58 § 2º).

   Ora, estes princípios fundamentais são claramente desrespeitados, quando, em Portugal, a taxa de desemprego se cifrou, em 2016, nos 11,1%.

   São múltiplas as razões atuais para este nível de desemprego, de que sublinhamos apenas três: a substituição da mão-de-obra por novos meios tecnológicos, as máquinas que entram nas linhas de produção e dispensam muita intervenção humana imediata; a crise económica, já que o consumo de bens, em tempos de crise, tende a diminuir, suscitando menor produção e mais despedimentos; e a baixa qualificação de alguns trabalhadores que, não obstante possa parecer o inverso, não acompanham a evolução tecnológica dos novos meios de produção. Razões a que, certamente, se juntam outras, menos evidentes e mesmo injustas, que potenciam tal nível de desemprego.

   Mas, referir o trabalho como um direito fundamental, não nos pode levar a pensar apenas numa das suas dimensões – a justa remuneração de todos, permitindo uma vivência digna de cada pessoa e do seu agregado familiar. Este é apenas um aspeto, embora determinante para essa dignidade da pessoa e para o justo equilíbrio da sociedade. O trabalho constitui ainda um direito fundamental da pessoa enquanto fator que lhe proporciona a sua realização pessoal. O Papa João Paulo II, numa das suas encíclicas – Laborem Exercens - definia dois conceitos para a compreensão do trabalho: a sua dimensão de «bem útil», servindo as necessidades básicas da pessoa; e a sua dimensão de «bem digno», enquanto fundamental para a afirmação da dignidade da pessoa, condição de afirmação dessa mesma dignidade. O trabalho responde, assim, a estas duas dimensões básicas, da pessoa: à realização humana, enquanto sujeito, e à sua digna subsistência, que lhe é devida. A que acresce, ainda, um terceiro aspeto: o contributo de cada um para o bem comum de toda a comunidade humana. O trabalho compreende sempre uma dimensão solidária, contribuindo «para multiplicar o património de toda a família humana», tomando assim, uma vez mais, as palavras do Papa João Paulo II.

   Ora, atendendo aos princípios enunciados – consignados nas leis civis e afirmados na Doutrina Social da Igreja – há que empreender um renovado esforço de reorganização e definição das leis laborais, de modo a que ninguém fique privado deste bem essencial. Sabendo que o trabalho constitui, hoje, um bem escasso, talvez necessite de uma nova solidariedade entre trabalhadores, bem como de uma redefinição de políticas de emprego, por parte dos empregadores.

   Certo é que o Estado não pode demitir-se dos princípios constitucionais a que está obrigado: o empreendimento de políticas de pleno emprego e a formação cultural e técnica de todos os trabalhadores.

   Só assim é respeitada a dignidade humana de cada sujeito e se constrói uma sociedade verdadeiramente justa. Princípio que poderíamos afirmar simplesmente como ético, mas cujo suporte legal se encontra nas leis fundamentais que nos regem enquanto sociedade.
 

Pampilhosa, 02 de Março de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(37ª Reflexão)