terça-feira, 4 de outubro de 2016

Tempo das colheitas!


TEMPO DAS COLHEITAS

    O mês de Setembro coincide com a época das colheitas! Este ano em menor quantidade, dizem os agricultores, como que a fazer jus ao ano bissexto em que nos encontramos. É certo que são menos os que dependem hoje exclusivamente do trabalho agrícola, pois entre nós continua a persistir uma agricultura de subsistência, assente no minifúndio. Não obstante, muitos são os que trabalham pequenas leiras de terra, recolhendo alguns dos seus frutos, que contribuem como boa ajuda para a subsistência familiar.

   Mas o tempo das colheitas detém uma carga simbólica, que o tempo foi esbatendo. Era neste período que os arrendatários - nos séculos passados denominados como foreiros ou enfiteutas - pagavam as rendas aos seus senhores, proprietários de largas parcelas de terra, pois na sua maioria estas eram agricultadas, assegurando a base da subsistência das populações e da economia da época. Dividiam-se as parcelas dos cereais nas eiras e cada um recolhia a parte que lhe pertencia; acrescendo ao foreiro a obrigação de entregar, ao seu senhor, parte de outros produtos, bem como o dízimo, que nem sempre pertencia à Igreja. Este sistema cessou nos finais do século XVIII, dando lugar a uma nova conceção do domínio da terra, muito mais democratizado. Pese embora nalguns espaços persistisse uma forma próxima dessas rendas antigas até períodos relativamente próximos de nós. Com o aprofundamento dos avanços tecnológicos, a beneficiar as grandes explorações agrícolas, e com as migrações internas das aldeias para as vilas e cidades, particularmente na segunda metade do século XX, as terras foram ficando cada vez mais sujeitas ao abandono. Muitas delas dando lugar a matos e a pinheiros. Hoje, muitas dessas terras, entre nós, foram invadidas pela monocultura do eucalipto, espécie florestal de crescimento rápido - não obstante a sua ação nociva para os solos, particularmente no que se refere ao equilíbrio dos lençóis freáticos -, como meio de rendimento igualmente rápido. Certo é que esta nova conceção da terra e da sua exploração se tem manifestado como lesiva para o bem-estar das populações, para o equilíbrio ecológico e mesmo para a biodiversidade que é uma riqueza a múltiplos níveis. Os recentes incêndios que assolaram o país, e que tanto nos perturbaram também a nós, vieram colocar-nos a questão do domínio da terra e das formas de exploração que devem ser permitidas. Não obstante a permanência da posse da terra na pessoa dos seus titulares, há hoje quem defenda uma nova intervenção dos municípios e uma dependência dos titulares face às suas orientações. Mais: há mesmo quem defenda, face à incúria de alguns proprietários, que a gestão das florestas deveria passar mesmo para o domínio público, assegurado precisamente pelos municípios, pagando os proprietários uma taxa associada a essa gestão, na qual se integraria a limpeza dos terrenos e a sua reflorestação. Tudo isto discutível; é certo!

   Inequívoca é a consciência de que necessitamos de uma nova conceção de exploração da terra, particularmente se florestada. Certamente que poucos agricultores, ou detentores de largas faixas florestais, têm capacidade de as gerir sozinhos, sobretudo quando urge um plano global para as múltiplas parcelas, englobando-as em áreas maiores, onde se possa repensar o modo de reflorestar, providenciando a uma nova fisionomia da floresta em Portugal.

   Urge, muito particularmente, providenciar a uma reflorestação com diversidade de espécies florestais, umas autóctones, outras implantadas, segundo a conveniência de um plano devidamente elaborado.

   Se o usufruto da terra passou a ser um direito particular, que nós não questionamos; a sua exploração requer presentemente novas formas de compromisso comunitário. Entre os foros do passado e o abandono do presente, é necessário um meio-termo que providencie à conveniente exploração da terra, seja a agricultada, seja a destinada à floresta. Este é um caminho de decisão – pois a reflexão está praticamente feita e vertida em lei – que tem de ser assumido por todos os intervenientes: proprietários, autoridades públicas e mesmo instituições associativas, criadas ou a criar. A bem da nossa segurança, do equilíbrio ecológico e da diversidade paisagística que, para além da segurança, constitui a mais-valia de ser atrativa até do ponto de vista turístico. Algo que nos diz tanto, nas terras bairradinas! Que não nos falte a coragem para implementar as medidas que, nas atuais circunstâncias, urge tomar!

Pampilhosa, 15 de Setembro de 2016
Pe. Carlos Alberto Godinho
(15ª Reflexão)