TRABALHO
O trabalho
é um direito fundamental da pessoa. Assim o afirma explicitamente a Carta Internacional dos Direitos Humanos,
quando refere: «Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do
trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção
contra o desemprego» (art. 23º, § 1). Seguida, depois, pela lei fundamental de
vários países, como Portugal, que afirma, na sua Constituição da República Portuguesa: «Todos têm direito ao
trabalho» (art. 58 § 1º). Princípio essencial que, segundo a mesma Constituição, se poderá assegurar
conquanto o Estado assuma o compromisso de promover «a execução de políticas de
pleno emprego; a igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género
de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do
sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais; a
formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores»
(art. 58 § 2º).
Ora,
estes princípios fundamentais são claramente desrespeitados, quando, em
Portugal, a taxa de desemprego se cifrou, em 2016, nos 11,1%.
São
múltiplas as razões atuais para este nível de desemprego, de que sublinhamos
apenas três: a substituição da mão-de-obra por novos meios tecnológicos, as
máquinas que entram nas linhas de produção e dispensam muita intervenção humana
imediata; a crise económica, já que o consumo de bens, em tempos de crise,
tende a diminuir, suscitando menor produção e mais despedimentos; e a baixa
qualificação de alguns trabalhadores que, não obstante possa parecer o inverso,
não acompanham a evolução tecnológica dos novos meios de produção. Razões a
que, certamente, se juntam outras, menos evidentes e mesmo injustas, que
potenciam tal nível de desemprego.
Mas,
referir o trabalho como um direito fundamental, não nos pode levar a pensar
apenas numa das suas dimensões – a justa remuneração de todos, permitindo uma
vivência digna de cada pessoa e do seu agregado familiar. Este é apenas um
aspeto, embora determinante para essa dignidade da pessoa e para o justo
equilíbrio da sociedade. O trabalho constitui ainda um direito fundamental da
pessoa enquanto fator que lhe proporciona a sua realização pessoal. O Papa João
Paulo II, numa das suas encíclicas – Laborem
Exercens - definia dois conceitos para a compreensão do trabalho: a sua
dimensão de «bem útil», servindo as necessidades básicas da pessoa; e a sua
dimensão de «bem digno», enquanto fundamental para a afirmação da dignidade da
pessoa, condição de afirmação dessa mesma dignidade. O trabalho responde, assim,
a estas duas dimensões básicas, da pessoa: à realização humana, enquanto
sujeito, e à sua digna subsistência, que lhe é devida. A que acresce, ainda, um
terceiro aspeto: o contributo de cada um para o bem comum de toda a comunidade
humana. O trabalho compreende sempre uma dimensão solidária, contribuindo «para
multiplicar o património de toda a família humana», tomando assim, uma vez
mais, as palavras do Papa João Paulo II.
Ora,
atendendo aos princípios enunciados – consignados nas leis civis e afirmados na
Doutrina Social da Igreja – há que empreender um renovado esforço de
reorganização e definição das leis laborais, de modo a que ninguém fique
privado deste bem essencial. Sabendo que o trabalho constitui, hoje, um bem
escasso, talvez necessite de uma nova solidariedade entre trabalhadores, bem
como de uma redefinição de políticas de emprego, por parte dos empregadores.
Certo é que o Estado não pode demitir-se dos princípios constitucionais
a que está obrigado: o empreendimento de políticas de pleno emprego e a
formação cultural e técnica de todos os trabalhadores.
Só
assim é respeitada a dignidade humana de cada sujeito e se constrói uma
sociedade verdadeiramente justa. Princípio que poderíamos afirmar simplesmente
como ético, mas cujo suporte legal se encontra nas leis fundamentais que nos
regem enquanto sociedade.
Pampilhosa, 02 de Março de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(37ª Reflexão)