quinta-feira, 6 de abril de 2017

Preconceito!


PRECONCEITO 

    Nos tempos que correm, em que tudo parece tão volátil e a imagem define muitas das nossas impressões interiores, corremos o risco de absolutizar essas mesmas impressões, tornando o nosso conhecimento algo de efémero; inviabilizando o aprofundamento da razão de ser das coisas e o conhecimento sério do mundo e das pessoas. Esta forma de agir, com base no imediato, no transitório e na primeira imagem, comporta o que definimos como preconceito, que carece sempre de novas abordagens, ulteriores desenvolvimentos e conhecimento mais aprofundado, para se poder tornar num autêntico conceito. Se o preconceito, que se define pela «ideia ou conceito formado antecipadamente e sem fundamento sério ou imparcial»[1] e ainda como «opinião desfavorável que não é baseada em dados objetivos»[2], se pode aplicar a todas as coisas, causando uma visão ofuscada da realidade e do mundo; torna-se particularmente grave quando se aplica à relação com as pessoas, podendo compreender mesmo atitudes de intolerância. Certamente que já nos aconteceu a todos fazermos juízo de uma pessoa, com base numa primeira imagem, que depois se esfuma na relação pessoal – para o bem e para o mal. A primeira imagem pode criar, ou não, alguma empatia, que só no conhecimento mais aprofundado do outro se pode esclarecer. Ora, nós tendemos, quantas vezes, a determo-nos na primeira imagem que construímos de algumas pessoas – o preconceito -, sem lhes darmos, pela relação interpessoal, a possibilidade de se revelarem tal qual são, na sua verdadeira identidade. Tal significa sempre um empobrecimento das relações humanas e uma limitação na capacidade de acolhimento e de conhecimento dos demais.

   Mas o preconceito pode advir, também, da impressão que os outros nos transmitem sobre uma terceira pessoa, passando nós a pensar segundo um conceito que não é propriamente nosso, mas daquele que no-lo transmitiu. Se não nos dermos a oportunidade de fazer a experiência pessoal do conhecimento dessa outra pessoa, fundamentando nesse conhecimento a nossa opinião pessoal, podemos tornar-nos profundamente injustos e precipitados na visão dos demais.

   O preconceito está muito mais presente nas nossas relações humanas do que podemos imaginar. Com o risco de selecionarmos as pessoas, com quem nos relacionamos, com base na aparência ou naquilo que delas ouvimos dizer.

   Necessitamos, pois, de redescobrir as nossas relações humanas – relações marcadas pelo acolhimento, conhecimento sério e pelo respeito mútuo. Por outro lado, não obstante acolhermos frequentemente impressões alheias sobre determinada pessoa ou mesmo famílias, necessitamos de estabelecer relações autênticas de conhecimento pessoal e social, que nos conduzam a uma visão justa e equilibrada do outro, ou dos outros, assente na nossa experiência e não apenas no que advém do conhecimento alheio.

    O preconceito, por vezes inevitável na nossa primeira abordagem à relação com o mundo e com as pessoas, nunca pode ser a estância última do nosso conhecimento, até porque, como refere William Hazlitt, «o preconceito é filho da ignorância». Necessitamos de ir sempre mais longe no conhecimento das realidades e das pessoas. Quanto a estas, o preconceito é sempre inimigo da relação humana. Ora, para termos relações humanas sadias, temos de ultrapassar sempre o perigo deste preconceito, abrindo-nos permanentemente aos outros em sincera atitude de alteridade, de acolhimento e de amor. Sabendo que só estas atitudes humanizam verdadeiramente as nossas relações interpessoais.

Pampilhosa, 23 de Março de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(39ª Reflexão)



[1] Voc. Conceito. In Dicionário Priberam. In https://www.preberam.pt [Consultado a 12.03.2017].
[2] Ibidem.