PRECONCEITO
Nos
tempos que correm, em que tudo parece tão volátil e a imagem define muitas das
nossas impressões interiores, corremos o risco de absolutizar essas mesmas
impressões, tornando o nosso conhecimento algo de efémero; inviabilizando o
aprofundamento da razão de ser das coisas e o conhecimento sério do mundo e das
pessoas. Esta forma de agir, com base no imediato, no transitório e na primeira
imagem, comporta o que definimos como preconceito, que carece sempre de novas abordagens,
ulteriores desenvolvimentos e conhecimento mais aprofundado, para se poder
tornar num autêntico conceito. Se o preconceito, que se define pela «ideia ou
conceito formado antecipadamente e sem fundamento sério ou imparcial»[1] e ainda como «opinião
desfavorável que não é baseada em dados objetivos»[2], se pode aplicar a todas
as coisas, causando uma visão ofuscada da realidade e do mundo; torna-se
particularmente grave quando se aplica à relação com as pessoas, podendo
compreender mesmo atitudes de intolerância. Certamente que já nos aconteceu a
todos fazermos juízo de uma pessoa, com base numa primeira imagem, que depois
se esfuma na relação pessoal – para o bem e para o mal. A primeira imagem pode
criar, ou não, alguma empatia, que só no conhecimento mais aprofundado do outro
se pode esclarecer. Ora, nós tendemos, quantas vezes, a determo-nos na primeira
imagem que construímos de algumas pessoas – o preconceito -, sem lhes darmos,
pela relação interpessoal, a possibilidade de se revelarem tal qual são, na sua
verdadeira identidade. Tal significa sempre um empobrecimento das relações
humanas e uma limitação na capacidade de acolhimento e de conhecimento dos
demais.
Mas
o preconceito pode advir, também, da impressão que os outros nos transmitem
sobre uma terceira pessoa, passando nós a pensar segundo um conceito que não é
propriamente nosso, mas daquele que no-lo transmitiu. Se não nos dermos a
oportunidade de fazer a experiência pessoal do conhecimento dessa outra pessoa,
fundamentando nesse conhecimento a nossa opinião pessoal, podemos tornar-nos
profundamente injustos e precipitados na visão dos demais.
O
preconceito está muito mais presente nas nossas relações humanas do que podemos
imaginar. Com o risco de selecionarmos as pessoas, com quem nos relacionamos,
com base na aparência ou naquilo que delas ouvimos dizer.
Necessitamos, pois, de redescobrir as nossas relações humanas – relações
marcadas pelo acolhimento, conhecimento sério e pelo respeito mútuo. Por outro
lado, não obstante acolhermos frequentemente impressões alheias sobre
determinada pessoa ou mesmo famílias, necessitamos de estabelecer relações
autênticas de conhecimento pessoal e social, que nos conduzam a uma visão justa
e equilibrada do outro, ou dos outros, assente na nossa experiência e não
apenas no que advém do conhecimento alheio.
O
preconceito, por vezes inevitável na nossa primeira abordagem à relação com o
mundo e com as pessoas, nunca pode ser a estância última do nosso conhecimento,
até porque, como refere William Hazlitt, «o preconceito é filho da ignorância».
Necessitamos de ir sempre mais longe no conhecimento das realidades e das
pessoas. Quanto a estas, o preconceito é sempre inimigo da relação humana. Ora,
para termos relações humanas sadias, temos de ultrapassar sempre o perigo deste
preconceito, abrindo-nos permanentemente aos outros em sincera atitude de alteridade,
de acolhimento e de amor. Sabendo que só estas atitudes humanizam verdadeiramente
as nossas relações interpessoais.
Pampilhosa, 23 de Março de 2017
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(39ª Reflexão)
[2]
Ibidem.