HUMILDADE
Uma
das características que mais enobrece a vida humana é a qualidade da humildade.
É certo que a palavra humildade, que provém do latim humilitate, significa coisas tão distintas como a qualidade do que
é humilde, modéstia, submissão ou inferioridade. Daí que tendamos a confundir,
não raro, humildade com humilhação, enquanto desvalorização de algo ou de
alguém.
A
verdade é que a humildade é a qualidade de quem age com simplicidade, verdade e
respeito. Ser humilde é ser simples e genuíno.
A
humildade não é nem retraimento de si, nem desconsideração dos outros. Pelo
contrário: a humildade, enquanto qualidade positiva e benéfica, permite-nos, a
título pessoal, avaliar, com verdade, as nossas capacidades – com suas
potencialidades e limites – e tornar-nos decididos na luta pela realização de
objetivos pessoais. E, na relação com os demais, leva-nos a compreender que
ninguém é melhor ou pior do que os outros, mas que todos devem ser igualmente
reconhecidos na sua dignidade, com autêntica cordialidade, honestidade e
respeito.
Vem
esta minha reflexão a propósito do Europeu de Futebol, que estamos a viver. Não
porque alguém tenha desrespeitado os seus adversários; mas porque tendemos a
querer celebrar por antecipação o que ainda não foi alcançado no seu espaço
próprio – o estádio! Bem sabemos que o desporto compreende estas atitudes, de
disputa entre «adversários», ainda por antecipação. Mas também aqui, como em
tudo na vida, devemos ser mais simples e humildes. É que só assim, sem perder a
garra e o entusiasmo, que nos levam a apoiarmo-nos numa causa comum, seremos
capazes de nos incentivar a crescer nos nossos objetivos, mas sem desconsiderar
aqueles que connosco se confrontam.
Neste
sentido, a humildade, numa perspetiva construtiva, compreende algumas atitudes que
me parecem fundamentais: a tomada de consciência de nós mesmos, com
simplicidade, e a definição clara de objetivos pessoais ou de grupo; o esforço
sério, o trabalho, e a exigência para que estes sejam alcançados; o respeito
pelos outros, nomeadamente pelos companheiros e adversários, sem nunca descurar
as suas capacidades; o confronto sério, respeitoso e equilibrado, onde a
excelência se alcança como resultado do nosso esforço; e, por fim, a capacidade
de celebrar as vitórias pessoais ou de grupo, sem nunca humilhar quem connosco
se bateu por um sucesso semelhante. E assim no desporto, como na vida!
Certamente que muitos de nós, a outros níveis, já experimentámos
exemplos singulares de humildade. Como o daquele professor catedrático, que
após ter atingido o cume da excelência na sua área de ensino e investigação,
passeava o seu cão no espaço do Jardim Botânico, em Coimbra, acolhendo com
simplicidade alunos e professores, que com ele se cruzavam, e para com quem
tinha sempre uma palavra simples e amiga. Ou ainda, um outro professor,
reconhecido internacionalmente pelas suas descobertas na área da botânica, que
ao chegar junto dos seus alunos, antes de iniciar as aulas, começava por os
abraçar. Ou aquele padre artista, de obra plástica singular, que nunca deixou
de ser o homem de postura simples e fraterna, mesmo no contexto do seu
reconhecimento pessoal. Exemplos singulares que me marcaram!
A humildade
abre-nos, efetivamente, ao desenvolvimento de nós e à valorização aos outros;
enquanto o orgulho, atitude antagónica da humildade, nos fecha nas nossas
certezas adquiridas, limitando o nosso crescimento pessoal; e fechando-nos, igualmente,
ao sincero, respeitoso e frutuoso reconhecimento dos outros. Compreendemos,
assim, a máxima de Ernest Hemingway: «o segredo da sabedoria, do poder e do conhecimento
é a humildade»; e ainda esta outra, de Rabindranath Tagore: «Quanto maiores
somos em humildade, tanto mais próximos estamos da grandeza»[1].
Pampilhosa, 23 de Junho de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(6ª Reflexão)