domingo, 3 de julho de 2016

Silêncio


SILÊNCIO
 

   Num tempo, este nosso, marcado pela agitação, pelos compromissos que se sucedem a um ritmo vertiginoso; pela sensação frequente de que o tempo é um bem escasso; marcado pela multiplicidade de palavras, onde cada acontecimento tem de ser coberto ao minuto (com jornalistas, nalgumas redações ou emissões diretas, pressionados no sentido de cobrirem acontecimentos ao instante, fruto da concorrência dos meios de informação, cada vez mais sofisticados e abundantes); num tempo marcado pela ânsia de comunicar, especialmente quando temos ao nosso dispor novos instrumentos de comunicação e partilha, mediante os quais somos como que solicitados a estar permanentemente on-line, para escutar ou responder a quem nos interpela; num tempo em que pautamos a nossa vida por um encontro contínuo com os outros, com o recurso às redes sociais; necessitamos, não raro, de parar, de fazer silêncio, para quebrar a dispersão interior e encontrarmo-nos connosco mesmos, restabelecendo o nosso equilíbrio interno.

   Com frequência ouvimos, todos nós, algumas pessoas dizerem: necessitava de fugir para um lugar isolado; onde pudesse descansar e não ouvir ninguém! Será, por certo, o reverso da realidade que acabamos de descrever, nem sempre positiva, é certo, mas um “grito” que evidencia um valor fundamental, de que continuamos a necessitar: o silêncio!

   O silêncio que não é apenas ausência de palavras; mas sim possibilidade de serenidade exterior e interior; de encontro connosco mesmos e com o nosso ser mais profundo! Um silêncio que não é apenas vazio; mas que é esvaziamento de tudo, para me encher de mim, da consciência íntima dos outros e para o encontro com a plenitude e o absoluto, onde, tantos de nós, reconhecemos o rosto de Deus. Um silêncio fecundo, a proporcionar a consciencialização dos nossos projetos de vida e sua revalidação, de modo a evitar uma permanente dispersão.

   Quem não fez já esta experiência, acompanhado por uma música suave, no íntimo da sua casa, ou simplesmente pelo bater das ondas, à beira do mar?

    É cada vez mais frequente encontrarmos gente que procura este silêncio. Gente que procura, a maioria das vezes, a paz interior, no encontro consigo e com a natureza, na intimidade exclusiva dos seus familiares mais próximos. Desde muito novo que me habituei a ouvir falar de famílias estrangeiras que procuravam os vales mais recônditos do rio Zêzere, onde acampavam, longe de tudo e de todos, vivendo a paz sublime que aquelas paisagens lhes facultavam. Ou ainda, desde jovem, aquando dos acampamentos do Mocanfe, começava a ver reerguerem-se velhas aldeias abandonadas, agora procuradas pelo seu silêncio, como o Talasnal, em plena Serra da Lousã. E que dizer, uma vez mais, do crescente número de peregrinos, que trilham os Caminhos de Santiago?! … Experiências distintas, como distintas são as suas motivações! Mas todas pautadas por um denominador comum – a busca de si, onde o silêncio é um sublime artífice! Um silêncio fecundo que regenera e reequilibra!

   Entre nós, fazemos memória de um espaço privilegiado de silêncio, bem no coração do Bussaco – o deserto carmelita! Um espaço que ainda hoje nos convoca ao recolhimento, à comunhão com a natureza e ao encontro profundo connosco mesmos! Ao mesmo tempo que, para alguns, constitui igualmente uma oportunidade de encontro com Deus!

   Tendendo a ser um ponto turístico de excelência, mas de um turismo de massas, porque não facultar a experiência do silêncio, na senda dos carmelitas? Uma interpelação que deixo em aberto!

   O silêncio é um dom a cultivar! Se um provérbio chinês afirmava: «A palavra é prata, o silêncio é ouro»; Aldous Huxley é sublime, ao referir: «o silêncio está tão repleto de sabedoria e de espírito em potência, como o mármore, não talhado, é rico em escultura»[1].

 

Pampilhosa, 30 de Junho de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(7ª Reflexão)