GÉNERO
Um
dos sinais mais inquietantes da cultura hodierna, pelo que significa de
degradação da identidade humana e da sua intersubjetividade e comunhão, é a atual
questão do género. Uma séria antropologia, assente em factos e não em simples
teorias, perfilha o princípio fundamental de que nos dividimos entre o
masculino e o feminino; isto é, entre a riqueza de ser homem e de ser mulher.
Este é um dado fundamentalíssimo da nossa identidade humana, que assenta numa
conceção antropológica com bases científicas – seja na conceção física,
psíquica, afetiva ou espiritual de cada ser humano. Todos nós somos homem ou
mulher; e nunca uma realidade neutra; ou, menos ainda, uma realidade
metamórfica que nos permita ser uma e outra coisa, de forma alternada ou
permanente, como se em nós subsistisse o «Hermafrodito» - a divindade grega
híbrida que, em certo sentido, representava a união entre Hermes e Afrodite.
A
teoria de género fez o seu percurso ao longo dos últimos séculos, particularmente
com as lutas feministas, na procura de suplantar a dominação masculina sobre o
feminino, ganhando nova cidadania a partir da década de setenta, do século
passado, com os estudos de género (gender
studies). Mas estes estudos deram origem, atualmente, a uma ideologia – a
ideologia de género - que dificulta a compreensão do ser humano, provocando uma
autêntica revolução no conceito de pessoa. A ideologia de género absolutiza o
individuo e o seu desejo subjetivo, independentemente de fatores determinantes de
caráter físico, psíquico, afetivo ou social. Esta ideologia, assente em quatro
pilares fundamentais: a negação da diferenciação entre homem e mulher, que
subsiste apenas devido a uma distinção social, e que será necessário
ultrapassar; a separação entre sexualidade e reprodução; a separação entre sexo
e género, o que significa que cada um pode ter uma característica sexual e
optar por viver um género diferente; e a multiplicação de termos para enquadrar
novas possibilidades de autodeterminação de género, rejeitando como pensamento
retrógrado e anticientífico quem reafirme os princípios tradicionais;
coloca-nos face a uma visão subjetivista e desestruturadora da realidade humana, conduzindo-nos a uma conceção
de pessoa que nega o que há em nós de mais profundo, pois nunca se pode
estabelecer a cisão entre ser físico e ser psíquico ou espiritual. O ser humano
é uno, sendo estas dimensões, que se interpenetram, constitutivas da identidade
própria de cada individuo. Certamente enquanto dado natural e socialmente
adquirido, sempre em aprofundamento, mas em conformidade com essa mesma
identidade.
Partilhando
o princípio da ideologia de género, chegaremos à negação da nossa identidade
pessoal; bem como à confusão do que pretendemos ser. Por outro lado, a
ideologia de género, abre espaço a uma desestruturação social, onde a autêntica
inter-relação, que é alteridade, em última instância se transforma em absoluto
egocentrismo, solidão existencial e isolamento.
Criados em «igualdade, enquanto pessoas humanas» (cf. CIC. 369), homem e
mulher são feitos um para o outro (cf. CIC. 372), completando-se nessa entrega.
Atente-se,
todavia, que a negação da ideologia de género não significa a inaceitação
terminante, sem discernimento, de outras formas de vivência da sexualidade e da
intersubjetividade, que não podemos agora analisar. Terminologias como
heterossexualidade, homossexualidade, bissexualidade ou transsexualidade,
derivam da mesma conceção básica da natureza humana, ou seja do modelo primeiro
do ser homem e mulher; deixando espaço, depois, ao modo como pessoalmente isso é
vivenciado.
Aceitar a ideologia de género significaria negarmos a nossa identidade
pessoal e social. Necessitamos urgentemente de nos redescobrir como pessoas, na
nossa identidade mais profunda; e como pessoas em relação, o que modela toda a
nossa vida em sociedade!
Pampilhosa, 09 de Junho de 2016
Pe. Carlos Alberto Godinho
(4ª Reflexão)