CELEBRAÇÃO
DAS BODAS DE PRATA PRESBITERAIS
Luso /
Pampilhosa – 22.12.2016
Caros Padres, irmãos no sacerdócio
ministerial
Caros irmãos e irmãs
Celebrar vinte e cinco anos de sacerdócio é, para mim, fonte de imensa
alegria, de graça e de louvor a Deus, sendo igualmente uma ocasião de renovada
responsabilidade na minha configuração com Cristo, Bom Pastor. Certo, ainda, de
que esta alegria e gratidão se estendem às comunidades cristãs, para quem o
Senhor olha com misericórdia e, pelos seus ministros - participantes da «função
de Cristo, pastor e cabeça» (LG. 28) - as congrega como família de Deus, em
fraternidade que tende para a unidade, conduzindo-as por Cristo e no Espírito
até Deus Pai (cf. LG. 28).
Celebrar vinte e cinco anos de sacerdócio é realmente uma ocasião de
graça, precisamente porque, sem mérito algum da minha parte, foi o Senhor quem
me olhou, me chamou, me consagrou e me enviou, para que, ao longo de todos
estes anos, fortalecendo-me com os seus dons, eu servisse os meus irmãos. Mistério
de amor que suplanta as minhas capacidades humanas, dom absoluto de Deus, que
suprindo todos os meus limites, continua a realizar, através dos meus gestos e
das minhas palavras, a missão que, sendo sua, continua a confiar-me. Missão esta
que acolho na simplicidade e na humildade e para a qual invoco permanentemente
a força do Seu Espírito, para que também eu, como o apóstolo, no meio das
dificuldades e limites, possa ouvir da boca do Senhor: «Basta-te a minha graça,
porque é na fraqueza que a minha força se revela totalmente» (2Cor. 12, 9).
O
ministério do presbítero, a quem comummente denominamos como padre, radica na
configuração com Cristo Pastor, porquanto, mediante o sacramento da ordem,
aquele que o recebe, «por meio da unção do Espírito Santo», fica marcado com um
caráter especial que o configura com Cristo – Sacerdote, a fim de poder «agir
em nome de Cristo – Cabeça», participando «da autoridade com que o próprio
Cristo edifica, santifica e governa o seu Corpo» (PO. 2). Ministério e mistério
que necessita de ser permanentemente aprofundado na vida de cada presbítero; e
que carece da oração e do empenhamento de cada comunidade cristã, para que, a
cada uma, nunca falte este dom hierárquico que o Senhor oferece a toda a Sua
Igreja.
Ao
celebrar estes vinte e cinco anos de presbiterado, brotam do meu coração duas
atitudes, que agora partilho convosco: gratidão e compromisso. Para as
explicitar, tomo a Palavra de Deus deste dia, particularmente da primeira
leitura e do Evangelho que, por feliz coincidência, nos oferece o Magnificat de Maria.
1.
Gratidão
Escutámos
na primeira leitura, do livro de Samuel, o cumprimento da promessa de Ana, que
havia recebido o seu filho na velhice, depois de uma súplica ardente ao Senhor.
Dirigindo-se ao sacerdote Eli, e depois das ofertas rituais, ela exclama: «Eis o menino por quem orei: o Senhor ouviu a
minha súplica. Por isso também eu o ofereço para que seja consagrado ao Senhor
todos os dias da sua vida» (1Sam. 1, 27 – 28).
Ana,
uma das mulheres piedosas do Antigo Testamento, que recebe uma especial graça
de Deus e que, em tempo de Advento, nos aponta para Maria, bem pode ser tomada
como símbolo da família, na sua capacidade de oferecer ao Senhor aquele que
gerou no seu seio.
Partindo deste exemplo de Ana, dou graças a Deus pela minha família,
onde nasci e cresci, não apenas fisicamente e nas demais qualidades humanas,
mas também no dom da fé. Se hoje sou padre, não poderei jamais esquecer o
testemunho simples e empenhado de meus pais, que, talvez sem o saberem, me
ofereciam ao Senhor como Ana, mãe de Samuel. A mim e a meus irmãos, na vivência
de um mesmo batismo, embora na diversidade da vivência cristã.
De
igual modo, dou graças a Deus pela minha comunidade de origem que, à imagem do
sacerdote Eli, me acolheu e me orientou na escuta da voz do Senhor – na
catequese; na liturgia, onde exerci, com alegria, o ministério de acólito, onde
tão apaixonadamente participei no grupo coral, que mais tarde orientaria, em
especiais ocasiões festivas; na participação de um efémero, mas vivo grupo de
jovens, que me permitiu a vivência da proximidade com os mais idosos e doentes,
particularmente em tempos litúrgicos fortes, em relação estreita com o grupo de
ação sócio-caritativa de então. Dou graças a Deus, pois esta comunidade de
origem foi, também ela, o berço da minha vocação. Se Deus chama através de
pequenos sinais, a sua escuta é habitualmente preparada pela vivência global da
vida cristã, proporcionada pelas comunidades paroquiais. Neste contexto, ainda,
dou graças a Deus pelos padres que colocou no meu caminho, tão diversos, entre
si, mas completando-se no seu acompanhamento discreto.
Dou
graças a Deus, nesta hora, por todo o percurso que pude fazer até à ordenação
presbiteral – os Seminários que frequentei e seus formadores, onde discerni,
aprofundei e formei a minha vocação sacerdotal; pelas paróquias de estágio
pastoral, aquando da frequência do Seminário Maior; pelos serviços e grupos que
pude integrar e que me prepararam para a diversidade da vida eclesial. A seu
modo foram um novo Eli, preparando-me para a missão pastoral.
Mas,
dou graças a Deus, de um modo especial, pelas comunidades paroquiais que servi
e que sirvo: foram elas que me acolheram e acolhem, para nelas realizar o
presbiterado que o Senhor me confiou a seu favor. Na amplitude cronológica de
vinte e cinco anos, recordo o Seminário Menor da Figueira da Foz, onde iniciei
o meu ministério; a Paróquia de Paião, onde primeiramente paroquiei, ainda como
vigário paroquial; para logo depois recordar as paróquias de Mira, Praia de
Mira, Vilamar, São Caetano, Alhadas, onde colaborei na ausência do pároco, e as
paróquias de Covões e Bolho. E, vindo da beira-mar para o interior da Bairrada,
tomei como casa o Luso, onde, desde há dezassete anos, sirvo a comunidade e, a
partir de onde, servi Trezói, Casal Comba e a Mealhada, para, desde há quase
dez anos, servir igualmente a Paróquia de Pampilhosa. Nelas, devo dizer, se realizou e realiza o desígnio do Senhor a
meu respeito. Num tempo, ainda, de abertura constante a novos desafios
pastorais, mesmo territoriais, com a necessidade de novas estruturas
intermédias de ação pastoral, como são as Unidades
Pastorais. Dou graças a Deus, também, pelos serviços eclesiais de maior
amplitude, a nível diocesano e nacional, que fui e sou chamado a exercer. Mais
que uma honra, estes serviços permitem-me compreender a missão da Igreja na sua
universalidade e a servi-la humildemente nas funções que me são confiadas.
Ainda no seio das comunidades cristãs, dou graças a Deus por todos aqueles que
me apoiaram e apoiam pastoral, espiritual e humanamente, na vivência do meu
ministério presbiteral. A sua ação e empenho, no dinamismo pastoral,
contribuíram e contribuem para o aprofundamento do ministério que me está
confiado, na necessária complementaridade, em ordem ao serviço das comunidades
cristãs. E, se dou graças a Deus pelo compromisso pastoral, agradeço-Lhe igualmente
o apoio humano, que me permitiu e permite, ao longo destes anos, a necessária estabilidade
pessoal para o exercício da missão. De entre as várias pessoas, que nestes
vinte e cinco anos me acompanharam e acompanham, e que hoje recordo com carinho,
agradeço a família Mira que, nestes dezassete anos de presença no Luso, tem
sido, para mim, como que uma outra família, servindo a comunidade também na
ajuda à estabilidade pessoal do pároco.
Enfim,
um olhar grato sobre o passado que me permitiu ser o que fui, ao longo destes
vinte e cinco anos, e sou no presente, recordando as comunidades, mas
especialmente cada uma das pessoas com quem, nas suas alegrias e esperanças,
angústias e dores, inquietações e certezas, partilhei e partilho a minha vida.
Bem posso dizer como Maria, no Evangelho: «A minha alma glorifica o Senhor e o
meu espírito se alegra em Deus meu Salvador» (Lc. 1, 46 - 47). É que, na
verdade, à imagem de Maria, também em nós o Senhor faz maravilhas (cf. Lc. 1,
49) e pelo ministério presbiteral que nos confia, «a sua misericórdia se
estende de geração em geração» (Lc. 1, 50).
2.
Compromisso
Celebrar vinte e cinco anos
de ministério ordenado é, ainda, momento de balanço – tempo para aferir da
minha identificação com Cristo Bom Pastor e de renovar o meu empenho no serviço
à Igreja. O percurso, pesem embora as incertezas da história, para cada um de
nós, estará eventualmente a meio. Assim, este é um tempo de novo compromisso;
tempo de reafirmar os propósitos da primeira hora, da ordenação, confirmados
pelo Bispo, quando este concluía, diante dos propósitos daquele que ia ser
ordenado: «Queira Deus consumar o bem que em ti começou». Uma nova hora para
assumir que «chamado por um ato de amor sobrenatural, absolutamente gratuito»
(DMVP. 13), o Senhor me pede que ame a Igreja como Ele a amou, consagrando-lhe
todas as minhas energias e dando-me com caridade pastoral, na entrega
quotidiana da minha própria vida (cf. DMVP. 13).
Mas
esta é igualmente uma hora de estímulo para as comunidades cristãs: no sentido
de redescobrirem a natureza e missão do ministério do presbítero; e de
assumirem o seu compromisso de despertar vocações sacerdotais no seu seio, para
que não lhes faltem os dons da graça e da santidade com que Deus
permanentemente as adorna, desde logo mediante o sacramento da Eucaristia.
Necessitamos, hoje, de outras famílias e
comunidades que, à imagem de Ana e do sacerdote Eli, ofereçam e preparem novos
sacerdotes para o seu povo, para que não lhe falte o anúncio da Palavra, a celebração
dos sacramentos e a edificação, na caridade, da autêntica família de Deus.
Que
Maria, na sua inteira consagração ao projeto divino a seu respeito, seja modelo
da nossa disponibilidade para continuarmos o anúncio e a vivência do Reino de
Deus, na diversidade de ministérios e carismas, para que, também hoje, se
perpetue essa outra afirmação do seu Magnificat: «A sua misericórdia se estende de geração em geração sobre aqueles que O
temem» (Lc. 1, 50).
Conclusão
Quisestes que estas celebrações,
dos meus vinte e cinco anos de presbiterado, se vivessem em torno da expressão
inscrita no recordatório da minha ordenação sacerdotal - «Sei em Quem acreditei!». Esta expressão, retirada da 2ª Carta a
Timóteo, insere-se na profissão de fé de Paulo, quando este exorta Timóteo -
seu «filho muito amado» (2Tm. 1, 2) - a reanimar o dom que Deus lhe concedeu
pela imposição das suas mãos (cf. 2Tm. 1, 6); convidando-o a nunca se
envergonhar «do testemunho de nosso Senhor», participando, com ele, «nos trabalhos
do Evangelho, fortificado pelo poder de Deus» e centrado no mistério pascal do
senhor Jesus Cristo, mediante o qual Deus nos salvou e chama à santidade (cf.
2Tm. 1, 9). Paulo diz sofrer por causa deste testemunho, mas sem nada lamentar,
porque sabe em quem acreditou (cf. 2Tm. 1, 12).
Queridos irmãos, rezai agora também por mim, para que acolha esta
exortação de Paulo e a viva no meu ministério: «reanimando constantemente o dom
da fé»; na alegria de testemunhar continuamente o mistério do Amor de Deus;
renovando a entrega da minha vida ao anúncio do Evangelho, no meio das alegrias
e das provações, mas sem nada lamentar; para que a graça de Deus chegue a todos
os que me são confiados, por «Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus» (1Cor.
1, 24); e todos cheguemos à salvação.
Que
Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe, a quem consagrei o meu ministério, interceda
por mim e por todos nós!