VIDA POR
VIDA
A Associação Humanitária dos Bombeiros da
Pampilhosa está a celebrar, neste ano de 2016, o seu nonagésimo aniversário;
assinalado, no passado dia 16 de Outubro, em cerimónia solene. São noventa anos
de serviço abnegado às comunidades locais – à Pampilhosa, às demais comunidades
concelhias e às necessidades de âmbito nacional, em cooperação com as demais
Associações de Bombeiros.
Para
além desta efeméride, que me leva, uma vez mais, a felicitar a nossa corporação
de Bombeiros, gostaria de sublinhar duas notas essenciais que definem e
enquadram a ação da maior parte das Corporações de Bombeiros do nosso país: o
seu lema e a sua condição de voluntários!
O
lema - «Vida por Vida» - expressa bem a natureza do seu serviço: uma entrega,
de corpo e alma, na proteção das pessoas e dos seus bens. Se é certo que um
lema traduz um ideal de vida, não é menos certo que os bombeiros – homens e
mulheres abnegados – o realizam com profunda dedicação, quantas vezes pondo em
risco as suas próprias vidas. Com frequência, na ânsia dessa salvaguarda, na
proteção de pessoas e bens, o ideal torna-se mesmo realidade, levando a que
algumas vidas se salvem, à custa do sacrifício de outras. Bastaria recordarmos
o World Trade Center, aquando dos
atentados de 2001, nos EUA: apesar da consciência do perigo, os bombeiros não
hesitaram em avançar para a sua missão. Ficando, muitos deles, sob os escombros
daqueles monstros de cimento e ferro!
Mas
o ideal «Vida por Vida» não deve entender-se como um sacrifício extremo de tal
nível! Deverá providenciar-se, ao invés, que, na sua ação, os bombeiros vejam
sempre salvaguardada a sua integridade pessoal. Daí a justa reclamação, de algumas
corporações, no sentido de que lhes sejam garantidas condições materiais de
trabalho.
O
ideal «Vida por Vida» vive-se cada dia, na capacidade permanente de abnegação,
de inteira disponibilidade para qualquer emergência, na capacidade de deixar
tudo por causa do bem do outro, em autêntica atitude de amor ao próximo! Sim:
amor ao próximo! Seja aquele que o realiza crente ou não crente, perfilhe este
ou aquele credo religioso, ou porventura nenhum, ou se reveja, ainda, em ideais
distintos de qualquer compromisso religioso. É que o amor não tem fronteiras – religiosas,
ideológicas ou institucionais. O amor realiza-se sempre que alguém serve o
outro, com a sua total disponibilidade, de tal modo que o bem alheio se
transforma no seu próprio bem e na sua alegria! Tal vivência traduz sempre o
que há de mais nobre no coração e no agir humano. E os bombeiros, fiéis ao seu
lema, realizam permanentemente gestos sublimes de amor, atendendo às
necessidades dos seus concidadãos, particularmente em situações de fragilidade,
debilidade ou de perigo. Volvidas as exigências do verão, receio que a ação dos
bombeiros regresse a um certo alheamento das populações. Quando, na verdade, a
sua ação – que é diária! – vai muito além do combate aos incêndios! Os nossos
bombeiros merecem, pois, o reconhecimento contínuo das suas comunidades, não
num permanente aplauso, que dispensam, mas no carinho que lhes é devido, no
reconhecimento das ações nobres que realizam e no apoio que lhes possamos dar,
ainda que com gestos simples de proximidade.
Releve-se,
por outro lado, que uma grande parte dos nossos bombeiros são efetivos voluntários!
Entre gente mais jovem e menos jovem (felizmente que os jovens são uma presença
evidente nas corporações, sinal que o ideal permanece e mobiliza!), muitos são
os que compaginam esta disponibilidade com o seu trabalho profissional, a
família e mesmo a convivência social, prontos a deixar tudo à chamada, para
corresponder à missão que se lhes confia. Sinal ainda maior dessa vivência
nobre de serviço aos outros, pois nada mais esperam em troca, senão o bem
daqueles que são chamados a servir.
Se
os bombeiros são, em si e pela sua ação, merecedores do nosso reconhecimento;
são, de igual modo, uma permanente interpelação à nossa consciência pessoal,
comunitária e social, no sentido de cultivarmos, entre todos nós, o que na
humanidade há de mais nobre – o cuidado de uns para com os outros. Numa
sociedade que tende a acentuar o individualismo, o seu ideal e a sua vivência
interpelam-nos a sairmos de nós mesmos e, em pequenos gestos, a vivermos o que
há de mais autenticamente humano! Sabendo que o amor de uns para com os outros
será sempre o ideal maior!
Pampilhosa, 27 de Outubro de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(21ª Reflexão)