NATAL
Estamos
em tempo de Natal! Expressão, que provinda do latim natalis, significa nascimento. Ora, o Natal significa o nascimento
de Jesus, o Filho de Deus que se fez homem no meio de nós! Ainda que alguns
possam não se rever nos conteúdos da fé, o Natal comporta, contudo, dois
elementos incontornáveis para todos nós: a realidade histórica de Jesus de
Nazaré e o seu nascimento, ainda que o dia de Natal seja definido a partir da
conceção do nascimento do sol invicto (natalis invicti solis), da mitologia
romana e sua expressão religiosa, que os cristãos, posteriormente, converteram
na data do nascimento de Jesus Salvador, como autêntico sol que ilumina toda a
humanidade; e a identidade cultural do Natal, que provém precisamente da
tradição cristã.
Em abono da verdade e já longe das práticas
mitológicas romanas, o Natal celebra sempre o nascimento de Jesus, Aquele que
depois proclamamos o Cristo, em virtude da Sua Morte e Ressurreição.
Todavia, desde meados do século XX, após a campanha economicamente agressiva
da americana Coca-Cola, que, em 1931, transformou a lenda de São Nicolau, que se
celebrava a 6 de Dezembro, com a habitual distribuição de presentes, no atual
Pai Natal - essa figura de aspeto rechonchudo, simpática, de barbas brancas e
vestido de vermelho, a cor da marca -, que tal figura veio a assumir
protagonismo nas celebrações natalícias.
De
um modo particular, o Pai Natal é uma figura atrativa para as crianças,
precisamente porque a sua principal missão, em cada ano, é distribuir
presentes, o que o torna particularmente cativante.
Ora,
o Natal compreende hodiernamente duas figuras: a do Menino Jesus e a do Pai
Natal. Inequivocamente, com presença e expressão bem distintas no nosso
contexto social. O Pai Natal é servido por um poderoso império comercial, aliado
aos ainda mais poderosos meios de comunicação social, capazes de mobilizar uma
sociedade inteira em torno de uma figura comum, definindo assim o sentido desta
quadra festiva.
O
Menino Jesus parece continuar a nascer escondido, na humildade da gruta de
Belém. O seu lugar, hoje, continua a ser o das nossas Igrejas e o espaço íntimo
de algumas famílias cristãs. Não obstante se celebre o Seu nascimento.
Mais
do que colocar em confronto duas figuras, ou, de alguma forma, pretender
excluir qualquer vivência do Natal, sinto que necessitamos de repor a verdade
desta quadra natalícia. Não apenas para fazer justiça ao Menino; mas para que a
nossa vida humana não seja apenas condicionada – diria mesmo: subjugada – pelos
interesses económicos. É que os grandes valores do Natal têm de estar para além
dessa tentativa de comercialização da vida humana, radicada nas compras, nas
ofertas e nos gastos. O Natal, assente na humildade do Deus feito Menino,
convida-nos à solidariedade, ao amor, à ternura, ao reconhecimento da dignidade
do outro, à partilha generosa, ao encontro e à fraternidade, realizando os
ideais humanos mais profundos, os únicos que são capazes de nos humanizar. Sim,
porque o Natal é humanização: não apenas de Deus que se faz homem, mas
igualmente do homem que O reconhece no rosto humano dos outros.
Além disso, só no Deus Menino ganha sentido a vida humana, na pobreza e
na abundância, na saúde e na doença, na alegria e na dor!... Nessa vida tão bem
retratada pelo conto de Eça de Queirós, O
Suave Milagre, que nos coloca diante de uma criança pobre e doente que
deseja ver Jesus. E quando a mãe tenta dissuadi-lo, por ser pobre, eis que
Jesus o visita. Este suave milagre é
uma interpelação e uma resposta à vida de cada um de nós, em tempo de Natal! No
sentido de vivermos a mesma consolação daquela criança. Escreve Eça de Queirós:
«De entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tremiam, a
criança murmurou: - Mãe, eu queria ver Jesus… E logo, abrindo devagar a porta e
sorrindo, Jesus disse à criança: - Aqui estou!».
Pampilhosa, 22 de Dezembro de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(27ª Reflexão)