SOLIDÃO
A
solidão é uma das vivências mais dolorosas da existência humana. Ver-se privado
da relação com o outro, ou com os outros, e obrigado a um isolamento na própria
intimidade, física ou emocional, sem interação com os demais, é sempre uma
vivência perturbadora para as pessoas que o experimentam.
Não
obstante as múltiplas formas de comunicação, de que hoje dispomos, o encontro
com o outro exige uma presença real; o olhar, olhos nos olhos; o abraço, em que
se expressa fisicamente o afeto; uma presença pessoal, que possibilite a
relação humana em verdadeira alteridade.
É
certo que existe também uma «solidão positiva» - assim denominada por vários
autores -, que permite o encontro consigo mesmo, a criatividade, o
aprofundamento intelectual, espiritual, ou existencial. Contudo, resultante de
uma opção livre e, em regra, limitada no tempo; compensada, depois, pelo
reencontro com os mais próximos, em família ou em comunidade.
Na verdade – como refere o adágio popular -
«ninguém é feliz sozinho», pois é na relação com os outros que nos descobrimos
permanentemente e nos construímos como pessoas, em desenvolvimento
autenticamente humano.
Ora,
a solidão toma hoje vários rostos! A solidão física, de quem vive isolado, não
raro devido às limitações da mobilidade e abandono, particularmente entre os mais
idosos. Depois, a solidão afetiva: de tantos que não se sentem acolhidos;
aceites na sua diversidade; amados; ou encerrados em si, nos seus dramas
pessoais, sem capacidade de abertura confiante a quem os rodeia, vivendo a sua
identidade mais profunda num reduto interior, inexpugnável e de solidão. Por
fim, a solidão social, hoje cada vez mais disseminada, seja pela fixação nas
tecnologias que isolam as pessoas, em espaços públicos; seja pelo
individualismo, que tende a fechar cada pessoa no seu mundo e nos seus
interesses; ou ainda, pela imposição social de isolamento àqueles que não são
amados comunitariamente, fruto das suas vivências humanas perturbadas por
qualquer fatalidade.
A
solidão, esse limite humano, fonte de dor e de angústia, exige, de todos nós,
uma nova humanidade e uma nova proximidade; que, em muitos casos, é expressão
de justiça e de dever. Exige essencialmente uma nova fraternidade!
Desde logo, necessitamos de redescobrir os valores familiares, não
permitindo que os mais velhos sejam privados dos mais novos e das relações que
lhe são devidas! É uma questão de justiça! Depois, a necessidade de aprofundarmos
o valor do voluntariado, na ação de visitadores, ou mesmo no acompanhamento
próximo de pessoas mais desprotegidas. Sinal muito positivo é o dos jovens
estudantes que habitam com idosos, beneficiando, cada um, do que ou outro pode
oferecer – a hospedagem e a companhia; criando-se, quantas vezes, laços
profundos de familiaridade. As próprias comunidades hão-de promover e dinamizar
novos centros de convívio e de encontro, onde se viva a comunhão entre as
pessoas e o seu enriquecimento humano.
Por
outro lado, todos nós devemos aprender a viver permanentemente o grande dom do
acolhimento, da aceitação do outro, na sua identidade e diferença, no respeito
pela sua verdade mais íntima. As amizades, sinceras e fiáveis, hão-de permitir
a expressão autêntica daqueles que nos são queridos, abrindo-os à sinceridade
diante de nós, por que se sabem amados. Todos nós devemos cultivar gestos de
ternura para com todos, quebrando tantos respeitos humanos e receios, que ainda
nos habitam. Precisamos de redescobrir a relação interpessoal, marcada pelo
encontro efetivo e não meramente virtual que, quantas vezes, é ilusório.
Necessitamos de quebrar as regras, que se impõem tacitamente, do isolamento em
público, para gerarmos novas interações entre pessoas, geradoras de uma nova e
autêntica humanidade. Necessitamos de reaprender o acolhimento para com todos
e, muito especialmente, para com aqueles que ninguém ama, na consciência de que
o isolamento e o alheamento geram mais problemas humanos e sociais, do que o
acolhimento sincero. Precisamos de quem ame famílias ou pessoas, vítimas de
situações humanas difíceis ou dolorosas, ajudando-as a recuperar a alegria e a
dignidade!
Um
ideal? Sim, um ideal! Mas um ideal realizável, se cada um de nós o abraçar! É
que só o amor, feito gesto de ternura e de acolhimento, é capaz de nos
humanizar!
Pampilhosa, 15 de Dezembro de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(26ª Reflexão)