terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Solidão!


SOLIDÃO
 
   A solidão é uma das vivências mais dolorosas da existência humana. Ver-se privado da relação com o outro, ou com os outros, e obrigado a um isolamento na própria intimidade, física ou emocional, sem interação com os demais, é sempre uma vivência perturbadora para as pessoas que o experimentam.

   Não obstante as múltiplas formas de comunicação, de que hoje dispomos, o encontro com o outro exige uma presença real; o olhar, olhos nos olhos; o abraço, em que se expressa fisicamente o afeto; uma presença pessoal, que possibilite a relação humana em verdadeira alteridade.

   É certo que existe também uma «solidão positiva» - assim denominada por vários autores -, que permite o encontro consigo mesmo, a criatividade, o aprofundamento intelectual, espiritual, ou existencial. Contudo, resultante de uma opção livre e, em regra, limitada no tempo; compensada, depois, pelo reencontro com os mais próximos, em família ou em comunidade.

   Na verdade – como refere o adágio popular - «ninguém é feliz sozinho», pois é na relação com os outros que nos descobrimos permanentemente e nos construímos como pessoas, em desenvolvimento autenticamente humano.

   Ora, a solidão toma hoje vários rostos! A solidão física, de quem vive isolado, não raro devido às limitações da mobilidade e abandono, particularmente entre os mais idosos. Depois, a solidão afetiva: de tantos que não se sentem acolhidos; aceites na sua diversidade; amados; ou encerrados em si, nos seus dramas pessoais, sem capacidade de abertura confiante a quem os rodeia, vivendo a sua identidade mais profunda num reduto interior, inexpugnável e de solidão. Por fim, a solidão social, hoje cada vez mais disseminada, seja pela fixação nas tecnologias que isolam as pessoas, em espaços públicos; seja pelo individualismo, que tende a fechar cada pessoa no seu mundo e nos seus interesses; ou ainda, pela imposição social de isolamento àqueles que não são amados comunitariamente, fruto das suas vivências humanas perturbadas por qualquer fatalidade.

   A solidão, esse limite humano, fonte de dor e de angústia, exige, de todos nós, uma nova humanidade e uma nova proximidade; que, em muitos casos, é expressão de justiça e de dever. Exige essencialmente uma nova fraternidade!

   Desde logo, necessitamos de redescobrir os valores familiares, não permitindo que os mais velhos sejam privados dos mais novos e das relações que lhe são devidas! É uma questão de justiça! Depois, a necessidade de aprofundarmos o valor do voluntariado, na ação de visitadores, ou mesmo no acompanhamento próximo de pessoas mais desprotegidas. Sinal muito positivo é o dos jovens estudantes que habitam com idosos, beneficiando, cada um, do que ou outro pode oferecer – a hospedagem e a companhia; criando-se, quantas vezes, laços profundos de familiaridade. As próprias comunidades hão-de promover e dinamizar novos centros de convívio e de encontro, onde se viva a comunhão entre as pessoas e o seu enriquecimento humano.

   Por outro lado, todos nós devemos aprender a viver permanentemente o grande dom do acolhimento, da aceitação do outro, na sua identidade e diferença, no respeito pela sua verdade mais íntima. As amizades, sinceras e fiáveis, hão-de permitir a expressão autêntica daqueles que nos são queridos, abrindo-os à sinceridade diante de nós, por que se sabem amados. Todos nós devemos cultivar gestos de ternura para com todos, quebrando tantos respeitos humanos e receios, que ainda nos habitam. Precisamos de redescobrir a relação interpessoal, marcada pelo encontro efetivo e não meramente virtual que, quantas vezes, é ilusório. Necessitamos de quebrar as regras, que se impõem tacitamente, do isolamento em público, para gerarmos novas interações entre pessoas, geradoras de uma nova e autêntica humanidade. Necessitamos de reaprender o acolhimento para com todos e, muito especialmente, para com aqueles que ninguém ama, na consciência de que o isolamento e o alheamento geram mais problemas humanos e sociais, do que o acolhimento sincero. Precisamos de quem ame famílias ou pessoas, vítimas de situações humanas difíceis ou dolorosas, ajudando-as a recuperar a alegria e a dignidade!

   Um ideal? Sim, um ideal! Mas um ideal realizável, se cada um de nós o abraçar! É que só o amor, feito gesto de ternura e de acolhimento, é capaz de nos humanizar!

Pampilhosa, 15 de Dezembro de 2016
Pe. Carlos Alberto G. Godinho
(26ª Reflexão)