Confesso que me espantam as primeiras razões que conduzem o Papa a permitir a celebração da Eucaristia segundo o "Antiquus Ordo", o rito de São Pio V. Num primeiro momento, julguei tratar-se de uma concessão feita à facção mais tradicionalista da Igreja, no sentido de gerar a comunhão com estes irmãos separados por um conjunto de princípios, nomeadamente no modo de celebrar os Mistérios da Fé. Lembro, por exemplo, os seguidores de Monsenhor Lefébvre e a sua inaceitação do "Novus Ordo". Apenas esta razão me parecia plausível para se avançar nesta concessão. Ainda que eu, pessoalmente, não concorde com ela.
Todavia, as primeiras razões apontadas, hoje, pela Agência Ecclesia, remetem-nos para a valorização do culto, tendo em conta os "«tesouros» espirituais, litúrgicos, culturais e estéticos ligado ao Rito Antigo".
A ser assim, e reagindo antes ainda de uma clarificação do Santo Padre, eu questiono-me sobre toda a pastoral litúrgica que a Igreja assumiu, e bem, desde o Vaticano II, dando à Eucaristia - centro da vida da Igreja - uma dimensão verdadeiramente comunitária, em toda a sua extensão: assembleia orante, diversidade de ministérios e serviços, expressão de uma verdadeira comunhão à volta de um único altar. Mesmo este, enquanto centro da celebração, retorna à simbologia do passado, deixando-nos entrever a celebração como realidade "privada" do ministro ordenado, afastando-se da dimensão comunional da Igreja, que na acção Sagrada se representa.
Francamente vou esperar pelo «motu próprio» do Papa. Mas desde logo me questiono sériamente sobre este regresso ao passado - que o Vaticano parece querer recusar! - e, sobretudo, sobre a imagem eclesiológica aí representada. Que Igreja queremos visualizar na celebração da Eucaristia: novamente a Igreja Hierárquica ou verdadeiramente uma Igreja Mistério de Comunhão, afirmação central da Lumen Gentium do Vaticano II, que tão bem se expressa na Reforma Litúrgica ? É que o modo de celebrar não é apenas um acto isolado. Pelo que acabo de afirmar, na Eucaristia evidenciamos a verdadeira imagem da Igreja!
Pe. Carlos Alberto Godinho